GOLPE BAIXO

O Tomás, seis aninhos de muita esperteza, foi matriculado na turma que pratica judô no seu colégio. Após fazer natação, ano passado, depois iniciação musical numa escolinha próxima, seus pais acharam por bem botá-lo para fazer um esporte onde pudesse descarregar as suas energias, que, aliás, vinham aflorando de maneira avassaladora. Eu que o diga, pois nas brincadeiras com o neto caçula, na minha casa, ele só me queria como “sparring” nas suas lutas favoritas, entre elas o judô. Cansei de tanto levar bordoadas! ...

Dia desse ele veio reclamar comigo de um colega seu no judô, o qual lhe teria aplicado um “chute no saco”, segundo suas próprias palavras. Levei a sério a questão e asseverei:-

“- Ora, Tomás, mas aí você devia ter reclamado com sua professora (isso mesmo, a sua treinadora é mulher), rapaz!...” – ao que o lourinho me respondeu, rápido e rasteiro:-

“- Não adianta, vovô. Ela não faz nada. Meu colega faz falta, ela diz que tem de sair do tatame, mas ele não sai, continua lutando!”

“- Uai, então tá faltando firmeza dessa professora. Vou ter que ver isso.”

Na aula seguinte fui levar o Tomás e fiquei atento durante todo o tempo do treinamento. Os garotos sentados, de pernas cruzadas, a treinadora de pé na frente da patota gesticulando bastante na sua preleção e eu ali, sentado num banco lateral, ao lado duma meia dúzia de pais e algumas mães dos alunos, cada qual torcendo pelo seu pimpolho.

Após a preleção e alguns exercícios de aquecimento, formaram-se as duplas e a mestra as chamava para praticar golpes dados com as pernas, objetivando derrubar seu oponente. A dupla chamada ia para o tatame, fazia a saudação de praxe um ao outro e a luta começava.

Daí a pouco o Tomás (kimono azul) é chamado junto com um menino moreno, cabelinho espetado, um pouco maior do que ele. Cumprimentam-se, curvando-se respeitosamente e a seguir se agarram nos kimonos um do outro, procurando cada qual derrubar o colega com um golpe de rasteira nas suas pernas (o tal do Ashi/Waza). Percebo o Tomás compenetrado e aguerrido, segurando firme o kimono branco do outro e, de repente “zás”, aplica um calço nas pernas do antagonista, derrubando-o no tatame.

A treinadora, atuando como juíza ao lado, marca ponto a favor do meu neto, a dupla retoma suas posições e reinicia o combate. Agarram-se novamente, puxa daqui e dali, de repente as pernas se enroscam e caem ambos com estrondo no tatame. Parece que houve empate no lance (?).

Os olhinhos brilhantes do Tomás me procuram no banco, ergo os dois polegares num sinal positivo e abro um grande sorriso, ao qual ele corresponde com um risinho de satisfação. A professora os coloca frente a frente de novo e a luta recomeça, com o Tomás jogando seu adversário à lona outra vez. Ergo os polegares, abro orgulhoso meu sorriso e encontro a carinha feliz do meu neto retribuindo meu gesto.

Ao término da aula, a professora reúne o grupo e tece algumas considerações. A seguir, chama alguns alunos, entre eles o Tomás, e lhes aplica no peito do kimono um pequeno botão branco. Quando vem me trazer o Tomás, ela explica:-

“- Esse botão, vovô, significa o bom desempenho do aluno na aula de hoje. O ideal é que ele o consiga durante todas as aulas, o que dará uma medida do seu aproveitamento aos pais, entende? O Tomás está de parabéns! ...”

Pego o lourinho e saímos à procura de um bebedouro e depois vamos à lanchonete, para uma vitamina e um lanche reparador. Aí ele se vira e diz:-

“- Vovô, você viu o colega que eu derrubei? “ – balancei a cabeça afirmativamente e o Tomás arrematou:-

“- Foi ele que me deu aquele chute no saco, sabe, vô? Mas agora já tá dominado!...”

-o-o-o-o-o-

B.Hte., 21/02/12

Nota:- Esta crônica completa os 50 (cinqüenta) textos escritos, tendo o TOMÁS, o caçula dos meus cinco netos, como personagem central. Tomás, de 6 (seis) anos, por estar sempre em nossa companhia, eu e a Vovó Mari, nos dá motivos e inspiração sempre para as minhas escrevenças do cotidiano.

RobertoRego
Enviado por RobertoRego em 22/02/2012
Reeditado em 31/01/2013
Código do texto: T3513492
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