A ORDEM E A ALMA.

A ALMA A TUDO ORDENA E COMANDA EM AÇÕES MAIS NOBRES, ASSIM MOSTRA SUA DESVINCULAÇÃO DA MATÉRIA, NÃO A DIRIGE, NÃO COMANDA O CORPO INTEGRALMENTE, COMANDA A VONTADE, FAZ PADRÃO EM SUA LIVRE ESCOLHA, CONCEBE OS CAMINHOS, MAS NÃO ESCOLHE POR VEZES OS MELHORES, DISTINGUE O CERTO E O ERRADO, É EXPRESSIVA NA OPÇÃO PELO MAL, LAMENTAVELMENTE, DIFERE DE TODO O REINO VIVO POR PENSAR, E DESSA FORMA FICA VISÍVEL SUA EXISTÊNCIA, QUE SE PROVA PELOS SENTIDOS NA ESCOLA DO AQUINATE, SÃO TOMÁS DE AQUINO.

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“Seria maravilhoso ver a própria alma. Conhece-te a ti mesmo é excelente preceito, mas só a Deus é dado pô-lo em prática. Quem mais pode conhecer a própria essência?

... a inteligência humana tem limites. Ninguém obteve nem obterá resposta.

Vejamos primeiro o que sabes, e do que estás certo. Que andas com os pés. Que digeres com o estômago. Que sentes com todo o corpo. Que pensas com a cabeça.

Pois bem. Pode a tua razão só por só dar-te luzes suficientes para concluíres, sem um recurso sobrenatural, que tens uma alma?

Aceita-se seja a alma um ser imaterial. Mas vós não concebeis o que seja esse ente imaterial.— Não, – respondem os sábios – porém conhecemos sua natureza: pensar.

— Como o sabeis?

— Porque ela pensa.

Que chamais então vossa alma? Que ideia tendes dela? Por vós mesmos, sem revelação, não podeis admitir em vós senão um poder de vós desconhecido de sentir, de pensar.

Agora dizei-me sinceramente: é esse poder de sentir e pensar o mesmo que vos faz digerir e andar? Confessais que não. Porque debalde ordenaria vosso entendimento a vosso estômago doente: Digere! Ele não digeriria. Debalde vosso ser imaterial intimaria a vossos pés gotosos: Caminhem! Eles não caminhariam.

Com razão observaram os gregos não ter o pensamento quase nenhuma influência no funcionamento dos órgãos. Admitiam para os órgãos uma alma animal. Para o pensamento uma alma mais tênue, mais sutil: um "nous".

Mas eis a alma do pensamento que em milhares de ocasiões governa a alma animal. Ordena a alma pensante às mãos que apreendam: as mãos apreendem. Porém não pode ordenar ao coração que bata. Ao sangue que circule. Tudo isso se faz independentemente dela. Aí estão as vossas duas almas metidas em maus lençóis e feitas péssimas donas de casa.

Não podes concebê-la senão pela fé. Tu Nasces. Vives. Ages. Pensas. Velas. Dormes. Sem saber como, Deus conferiu-te a faculdade de pensar como tudo o mais. E se não viesse ensinar-te nas idades assinaladas pela sua providência que tens uma alma imaterial e imortal, dela não terias prova alguma.

Diz Santo Tomás (questão septuagésima quinta e subseqüentes) que a alma é uma forma subsistente per se. Que está em todas as coisas. Que sua essência difere de sua potência. Que a memória das coisas espirituais é espiritual. Que a memória das coisas corporais é corporal. Que a alma racional é uma forma imaterial quanto às operações e material quanto ao ser. Santo Tomás escreveu duas mil páginas dessa força e dessa clareza. É o pai da escola.

Não é menor o número de sistemas forjados sobre a maneira de sentir da alma depois de desertar do corpo por meio de que sente. Como ouvirá sem ouvidos. Como olfatará sem nariz. Como tocará sem mãos. Que corpo retomará de futuro: o que tinha aos doze ou aos oitenta anos? Como o eu, a identidade da mesma pessoa subsistirá. Como a alma de um indivíduo tornado cretino à idade de quinze anos e que cretino tenha morrido aos setenta anos retomará o fio das idéias interrompido na puberdade. Por que milagre uma alma que haja perdido uma perna na Europa e um braço na América reencontrará essa perna e esse braço. (Que, tendo se transformado em legumes, terão virado sangue de algum outro animal).

Singular é não haver nas leis do povo de Deus palavra sequer a respeito da espiritualidade e imortalidade da alma. Nem no Decálogo, nem no Levítico nem no Deuteronômio.

Em passo algum – e sobre isto não paira a menor dúvida – Moisés promete aos judeus recompensas e castigos em outra vida. Nem lhes fala da imortalidade da alma. Não lhes acena com céu nem os ameaça com inferno. Tudo é temporal”. VOLTAIRE.

Celso Panza
Enviado por Celso Panza em 22/02/2012
Reeditado em 22/02/2012
Código do texto: T3513351
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