LEGADO

Olha ... que merda... Que merda mesmoooo... Você faz tudo:

Paga aulas (caríssimas) de inglês, ensina francês, piano, crochet, põe no ballet...

Exige as melhores notas na escola e determina desempenho excellent em coisas do cotidiano, da cultura e até mesmo da modernidade como o subversor (se é que essa palavra tá no aulete [porque ela é muito feia]) Inglês... língua universal, vá lá tá valendo nesse mundo onde não podemos fazer escolhas, mas sim, opções rentáveis e utilizáveis.

E depois, e depois??? Depois tudo é depois, tudo muda e cria formas monstruosas que se voltam contra você. Adoleta. ADOLESCÊNCIA...

É.

Você mesmo. Senhor Paroquial, dedicado aos bons costumes e boas maneiras, que sempre respeitou os 10 mandamentos e assistiu a tantas missas do galo quanto consta no seu registro de nascimento a sua idade. Você que sempre deu exemplo aos seus. Pagou sempre seu IPTU em dia, até com desconto por antecipação.

Daí, vem esse ser que nasce de você, e de repente, ou surpreendentemente, resolve pintar o cabelo de azul, colocar um alargador na orelha e te chamar de velho careta... E nisso você tem apenas 35 anos. É, criatura de deus. Você é mesmo um simples mortal. Nada que você fale ou pense serve de experiência aos que vêm depois de ti. Eis você... com suas convicções. E de nada valem.

Isso é ser pai/mãe. Doação sem limites, entrega total, desinteressada e sincera. Parece até inútil. Mas não será, pode ter certeza.

Um dia, sua cria, com toda essa asa que acha que tem para dar vôos altos ou rasantes, se servirá do bem pago inglês para se aventurar pelo mundo com uma mochila nas costas e contar aos seus amigos como foi boa sua aventura (claro!, não passou fome nem ficou sem dormir porque aprendeu o verbo to be ou o être e avoir), tem a malandragem brasileira na alma e ainda ganha um troco tocando piano num restaurante Belga, fazendo alguma performance em ruas da Europa graças à habilidade motora adquirida pelo ultrapassado ballet que você tentou dizer que era interessante. OU quem sabe fazer tapetes para ganhar a vida na penitenciária (olha aí o crochet valendo mais que simples cultura européia) se chegar a esse extremo. Mas acho pouco provável, estou pensando apenas em todas as possibilidades, boas ou ruins.

É assim mesmo, pai//mãe... não espere confetes nem reconhecimentos imediatos, deixe seu filhote amadurecer e perceber que a vida é um conjunto de vidas, experiências, conhecimentos e culturas. Umas boas (as que você tentou enfiar na cabeça de seu pupilo) e umas ruins (as que ele adquiriu na tua ausência quando a vida virou madrasta).

Pode estar certo, um dia ele volta. Mas, se não voltar (ou voltar e não confessar) ficará sempre na lembrança dele o berço que você o deu. Isso é

Tudo. O resto... é resto. E espero que alguém me contradiga (se é que essa palavra existe no aulete[porque ela também é muito feia]). BJOSSS.