Há uns cinco anos meus ouvidos enchem-se de alegria e desperto feliz da vida às 6:30 das manhãs dos sábados que antecedem aos sábados que iniciam os carnavais.
Chico está presente ao me fazer recordar a letra da música “A Banda”, quando canta: ”A moça feia debruçou na janela/ Pensando que a banda tocava prá ela...”. Não me sinto feia, não debruço na janela, nem é a banda que toca. Prefiro pensar que ele toca para mim. Ele, quem? Não sei, nem quero saber. Talvez um anjo solitário que ame carnaval, que ame alguém, que insista em ser o desconhecido, ano após ano, que goste de tocar, que queira ser lembrado sempre, na mesma data, no mesmo lugar, pela música belamente tocada de seu clarinete (Será este o instrumento? Tenho dúvida). Já pensei, confesso, em ir até lá, mas para quê? Perder o encantamento? Há casos em que é melhor deixar a fantasia e a ilusão encontrarem um cantinho na nossa alma e deixar registrado o belo, o romantismo e o mistério. Sou curiosa, como a maioria das pessoas, mas neste caso, o bom senso me faz ficar sonhando acordada e curtir a música: “Bandeira branca, amor/ Não posso mais/ pela saudade que me invade eu peço paz...”. Contrario dizendo-me que posso, sempre posso porque quero. Quero porque estou aprendendo com meu neto Léo, de dois anos e oito meses, que me diz: ”Vó! Sou forte e sou esperto.” Digo-lhe que é verdade! Ele está ficando esperto, não no sentido da esperteza vulgar, a que é apregoada em diversos segmentos, como o ser vigarista que passa a perna nos outros, o ser corrupto, como a maioria dos políticos e outros que infestam o nosso meio. Refiro-me à esperteza em ser inteligente, em buscar resolver problemas de forma afetiva e racional, em saber reconhecer quem merece a confiança e quem tem que ser tratado com distância, por ser adepto do ganhar de qualquer jeito, tirando proveito das pessoas crédulas , do bem etc. Tomara que ele siga o caminho do bem e da justiça. Quanto à “ saudade que me invade” esta fez morada há muito e sei o gosto triste que tem. Não é necessário ficar revelando que há feridas na alma. A gente sente calada e tenta sentir que a vida pulsa. Diz Lia Luft “ que é melhor deixar que os mortos morram (quem viveu isto entende). Concordo. A gente tem que deixar os mortos em paz, o que não impede que estejam vivos dentro de nós.
Retorno ao músico desconhecido que toca e parte, talvez tocar na porta de outros, mas sei que parte mudo até o próximo ano. O que levará com ele depois que sabe que despertou uma ou várias pessoas? Será que é para alegrar uma amada? Algum amor proibido? Quem sabe?
O clima emocional deixado pelo seresteiro do nascer do dia é de sentir que o tempo muda algumas pessoas. Já vivi intensamente muitos carnavais, com pulos e pulos de alegria ao dançar os seus quatro dias. Hoje peço descanso, inclusive nos dias que antecede o carnaval. Sendo assim, optei com amigas ir ouvir o Pompe e um outro jovem e bom cantor, no Engenho Massayó, fazendo uma viagem para ter um encontro com o Chico Buarque. Vejo-o maduro, tranquilo, andando calmamente pelas ruas de algum país. Brincamos para descobrir o lugar já que não apareciam marcos turísticos. Estaria ele em Praga? Londres? Descobrimos que em Paris. A voz de Luís Pompe, com excelente repertório, fazia voltarmos no tempo e aí, lembrarmos o que canta Chico, Em Sonho de Carnaval: “ No carnaval, esperança/ Que gente longe viva na lembrança/ Que gente triste possa entrar na dança/ Que gente grande saiba ser criança”. Para os que continuam amando a folia e os que preferem escutar calmamente as músicas de Chico, ele nos presenteia com “Quando o carnaval chegar”, ao musicar: ”...Eu vejo a barra do dia surgindo/ Pedindo prá gente cantar/ Tô me guardando prá quando o carnaval chegar.”

Edméa
Enviado por Edméa em 15/02/2012
Reeditado em 16/02/2012
Código do texto: T3501556