O Super Homem
Estava na janela olhando a chuva cair no chão de asfalto para sentir aquele cheiro do passado... de quando era um garoto brincando e sonhando.Quando, como por encanto passa um rapaz, com mais ou menos vinte e seis anos aparentando mais ou menos trinta e lá vai poeira, numa bicicleta muito usada, com uma tabuleta na frente indicando que ele consertava fogão, ventilador, geladeira e encanamento. Entre os braços e o guidom carregava uma especie de mural de quiquilharias para vender, tais como: chicote para ferro, chip, caneta, pulseiras, cordões, relogios, carregadores,cintos, meias e etc...
Atrás, no lugar da garupa uma espécie de bandeira de papelão, toda plastificada por causa da chuva, contendo a informação de venda de bingos eletrônicos da sorte nas cores da bandeira do seu Estado.
Aquele sábado, cedo damanhã, a chuva caindo lentamente, a rua deserta e muita gente ainda dormindo, aquele rapaz seguia trabalhando.
Passou o sábado e por coincidência, quando estava indaa pizzaria com os meus filhos.Lá pelas dez da noite, o mesmo rapaz passou por nós da mesma forma...Montado em sua bicicleta.
Terci um comentário e uma dos meus filhos falou:
_ Pai, se o senhor prestar mais a atenção ou ficar maisna janela,verá que esse rapaz passa todos os dias.
Curioso então, no decorrer da semana, quando chegava do trabalho, só dormia quando o rapaz passa de volta. E foi assim a semana toda até entrar pelo domingo.
O mês se passou e creio que até esqueci.Mas quando chegou dezembro ao estar sobre a casa ornamentando-a para o natal, eis que lá vem o nosso amigo.Feliz e assoviando, como se a vida dele fosse fácil.
Sem me conter resolvi para-lo e comprar alguma coisa.
- Bom dia amigo!...
- Bom dia senhor! O que vai querer comprar ou consertar?!...
- Na verdade,queria comprar a sua vida!
Com espanto o homem olhou e respondeu:
- Como assim a minha vida?!...
- Desculpe, só queria saber mais de você. Onde mora, como vive e suas queixas.
Sem titubear o rapaz agasalhou abicicleta em minha casa e pediu-me que o seguisse.
Descemos e subimos ladeiras, entramos numas estivas, passamos por debaixo de algumas adriças de roupas echegamos na última casa daquele lago.
Ele me apontou de disse:
- È ai que eu moro.
Quando ia esboçar uma reação várias crianças gritaram da porta e da janela...
- Ei é o papai!... É o papai.Ele voltou cedo!
Estupefato com uma casa decrepta, me vi impotente até de entrar.
Pensava como um ser humano se submete e submeteoutros aquelas condições decreptas.Me perguntava qual o papel do Estado, da sociedade, quando uma forte chuva nos fez entrar no casebre.
A esposa de Francisco, era dona Altamira, uma moça de dezesete anos, com cara de trinta. Dois filhos pequenos e um na barriga.
Não tinha fogão, não tinha geladeira, não tinha panelas...
Quase tudo era de lata de refrigerante, de garrafa pet e um caniço improvisado para pescar no seu imenso quintal.
O que se podia chamar de guarda roupa era um cesto com montoeiro de trapos, uma televisão, uma padiola com gelo, duas janelas ao lado e uma porta dos fundos que dava para o imenso lago.Papelão pelo chão e duas redes. A casa em sí mais parecia que ia cair, do que se segurar.
O que mais me impressionou foi aquela energia, aquele ar, de não desistir jamais,de que viver a vida é o importante.Enquanto eu pensava, dona Altamira, do nada me ofereceu um copo de café.
Disse comigo:
- Meu Deus, esse Brasil o mundo precisa conhecer.
Quando a chuva passou, me despedir das crianças, que brincavam com pilhas e caixas de fósforos, como a muito eu não vi.
Segui a trilha de Francisco na ponte eaos poucos percebi, que muitos alí eram assim.
Aquela tribo de sobreviventes, eram gentes, que não morriam.
Na verdade aprendiam a viver e eram muito mais resistentes que qualquer mortal da capítal.
De volta a minha casa, pergunte a Francisco:
Como você é feliz com toda essa dificuldade rapaz?
Ele sorriu e me disse:
- Doutor, é a Família.