O caso do cachorro que sabia ver as horas

Quando vivi na França, eu via muita gente andando com seu cãozinho pelas ruas, o que ainda não era moda por aqui. Em pequenas lojas e mercadinhos havia cartazes proibindo a entrada de animais e alguns chegavam a colocar uma barra na calçada para se prender cachorros, o que me fazia lembrar os filmes de far-west. Enquanto seus donos faziam as compras, eles ali ficavam latindo e às vezes até saía briga. Algumas mulheres, voltando com os filhos da escola, ao atravessar a rua carregavam o animalzinho no colo. E as crianças iam soltas, comportadinhas, pela faixa de pedestre... Alguns motoristas de táxi andavam com enormes cães ao seu lado, o que costumava assustar os fregueses, porque assim que abriam a porta eles se punham a latir furiosamente. Os taxistas diziam que era para se proteger, mas eu penso que eles gostavam mesmo era da companhia. Do mesmo modo daqueles que não se separavam dos cães de jeito nenhum, levando-os até a locais inesperados. Juro que vi numa confeitaria chique um cachorro sentado à mesa com seu dono, cada qual numa cadeira e com uma taça diante de si. O homem tomava uma colherada, depois pegava a colher do ‘amigo’ e lhe dava o sorvete na boca, que o cachorrinho aceitava de bom grado...

Foi lá que me contaram o caso do cachorro que sabia ver as horas. Numa cidadezinha do interior, todas as tardes, às quatro e meia em ponto, ele chegava correndo para encontrar as crianças na saída da escola. Nunca falhava. Era a maior festa e todo mundo ficava intrigado. Seus pequenos donos diziam que ele sabia ver as horas e o mistério permaneceu até o dia em que ele não apareceu. Entre as mães corria um zum-zum de que tinha havido um acidente na estrada de ferro ali por perto. As crianças ficaram alvoroçadas. Será que o coitadinho tinha sido atropelado?... Em bando, correram até sua casa. Surpresa e alegria geral. Lá estava ele refestelado, dormindo tranquilamente.