A MENDIGA
Cibele Carvalho
 
 
 
Chega junto com a noite, para dormir na praça de um bairro classe A.
 
Seus poucos pertences brigam por espaço dentro de uma sacola e, quando são retirados, parecem respirar aliviados. Estranhamente, são limpos como sua dona.
 
Se o tempo está firme, deita-se no banco de concreto. Quando chove, acomoda-se debruçada sobre a mesinha abrigada que, durante o dia, serviu de tabuleiro de jogos para os aposentados. 
 
Antes de deitar, pratica um ritual invariável: faz " touca" nos cabelos pintados, cobre-os com um pano como uma camponesa, e envolve-se cuidadosamente em suas cobertas que são trocadas e mantidas limpas.
 
Não esmola e compra seu lanche noturno na mercearia em frente à praça.
 
Especula-se sobre seu destino durante o dia - uns dizem que trabalha em algum lugar sem direito a dormida e que, por morar longe, escolheu a praça como dormitório; outros dizem que é simplesmente maluca.
 
Quem saberá sua verdadeira história? Provavelmente, nem ela.
 
Talvez seja algum resgate de vidas passadas.
 
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RJ, 06/02/12