_Trocando ideias
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– Se em Ideia não tem mais acento onde é que vou sentar?
– Como é que é, Quermezé?
– Isso mesmo, Seuzé! Onde é que vou sentar?
– Homi, você tá bestando, é? Não é a Ideia do Seu Jacu, não! Foi a palavra ideia que perdeu o acento... Nem sei pra que isso serve. É um acento pra lá e pra cá, numa dança de pode e não pode que não tem mais fim! Se pelo menos fosse num reboliço de pé-de-serra dum forrozinho bom da gota...
– Mas se a D. Ideia perdeu o acento, então deve ter tido um fim, ora!
– Perdeu não, homi de Deus! Se D. Ideia tiver sido batizada com acento ela vai é morrer com ele!
– Nasceu, sim, Seuzé! E que assentão! O amigo nunca que reparou quando ela se senta, o tamanho do assento? Aquilo é duma circularidade que até na posição e agudeza do acento, numa crescente pra direita, revela-se o poder da esposa do nosso amigo Jacu.
– Homi!
– Queria mesmo era ver a certidão dela!
– Pra que, seu fofoqueiro duma figa?!
– Homens não fofocam; homens apenas negociam assuntos da vida alheia!
– Então vá estudar francês!
– E o que o tal de francês tem a ver com D. Ideia?
– Não gosta de olhar os assentos dos outros? Pois então, no francês tem acento pra meio mundo de curiosidade!
– Agora foi que deu curiosidade mesmo...
– De que, homi?
– Será que Jacu tem acento também?
– Depende, Quermezé!
– E é?
– Separe as sílabas!
– “JA – CU”. Homem, isso tá me cheirando é ruim que dá nojo! Vamos tentar outro nome?
– Por que, seu coisa ruim?! Não queria bisbilhotar o povo? Agora vamos!
– Que tal só a primeira sílaba? Vamos deixar o detalhe do acento da segunda sem discussão, é melhor!
– Vamos inverter a ordem. Maracujá. Sílaba por sílaba: “MA – RA – CU – JÁ”. Agora o já tem acento.
– E a parte do assento do Jacu ficou no meio, do mesmo jeito! Homi, vamos falar sobre outras coisas?
– Mudou de ideia, Quermezé?
– Não, claro que não! Esse maracujá murcho estava dando era sono, mas agora que D. Ideia vem vindo, toda serelepe igual a pinto remexendo em angu quente, vou é “recumeçar” minhas observações “assentativas”!
– Tome jeito, seu cabra!
– Bom dia, D. Ideia!
– Tudo bem, Seu Quermezé?
– Tudo tão certinho, Dona, que dá é medo! A senhora aceitaria sentar? Não é o mesmo assento que tem lá no seu bar e do amigo Jacu, não, mas é de coração a oferta. A senhora não faz ideia de como faz bem ao coração poder assentar a senhora aqui no meu boteco das goteiras, mas de muito agrado...
– Grata!
Os amigos se afastam para um particular e...
– Homi, tem acento no registro! Aposto que tem! Agora prestei atenção na redondeza...
– Só pedindo pra ver, Seuzé.
– Então peça, ora!
– E se ela mudar de ideia pra não revelar a idade?
– Você não é homem, não?
– Sim! Cê tá duvidando, cabra?
– E então não sabe que depois de saciar a curiosidade os acentos caem?
– Verdade! Vou perguntar...
– Oh, D. Ideia! A senhora, com esse nome todo remexido pelo povo, nasceu, de batismo, com ou sem acento no registro? Tire esses dois coitados duvidosos duma agonia!
– Foi sem acento, seu Quermezé, mas o povo diz que deveria ter, que tenho acento, sim!
– Eita povo arretado! A voz e o desejo do povo sempre revelam verdades! A senhora fica melhor mesmo é com acento, d. Ideia.
– Grata!
– Matou a curiosidade, Quermezé? – pergunta o amigo.
– Sim, mas o acento, esse danado, vai demorar pra cair!
Crato-CE, 9 de fevereiro de 2012.
06h14min