UM GOL AMALDIÇOADO
Felisberto era um torcedor apaixonado pelo Flamengo e acompanhava os jogos do seu time do coração pelo radinho, de vez que a televisão era coisa rara nas casas e nos botecos de Santo Inácio das Amendoeiras, lugarejo lá pras bandas de Mossoró, no interior do Rio Grande do Norte.
Um parente seu que morava no Rio de Janeiro trouxe-lhe, por ocasião das festas de fim de ano, um aparelhinho desses modernos com minúsculos fones de ouvido, onde ele poderia ouvir música, notícias e até o futebol do seu Flamengo querido. O torcedor potiguar ficou feliz como nunca, usava direto e reto seu novo brinquedinho e só se desgrudava dele na hora do banho.
Num domingo à tarde, a Igreja de Santo Inácio abarrotada de fieis na missa vespertina, Felisberto acompanhava o ofício sentado num dos últimos bancos da nave, mas com o aparelhinho ligado e os fones acoplados às suas orelhas grandes. Não estava nem aí para a missa e o sermão do Padre Vicente, pois o seu “Mengo” jogava com o Botafogo, a partida estava duríssima e ele não perdia nenhum detalhe da sensacional narrativa feita pelo Luciano do Vale, o mais festejado locutor esportivo do país.
De repente, bem na hora em que o Padre Vicente erguia a taça com o vinho, durante a “Consagração”, a igreja toda no mais absoluto silêncio, todos os paroquianos compenetrados, Ronaldinho Gaúcho marcou um golaço e abriu o marcador para o time carioca.
O rubro-negro Felisberto, antenado no jogo, deu um pulo de felino e soltou um grito formidável que repercutiu por toda a igreja matriz:-
“- Gooooolllll ... Gooooolllll do Flamengooooo! ...”
Faltou pouco para que o Padre Vicente excomungasse o Felisberto e, a partir desse dia, ele só ingressava na paróquia após minuciosa revista feita pelo sacristão Juvenal dos Anjos, o qual, inclusive, lhe enfiava os dedos até nos ouvidos pra ver se havia aqueles pequenos fones conectados.
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B.Hte., 02/02/12