AUSÊNCIAS

AUSÊNCIAS

Nas mais de cento e cinquenta crônicas que escrevi, não consegui lembrar-me de todos os personagens que fizeram parte de minha vida, seja em qualquer de suas fases. Nem poderia, creio eu! Impossível recordar de tudo. Então, volta e meia, dou de cara com alguém que leu e não consta de meus livros. Aí, a observação é fatal:

- Puxa Lima, você me esqueceu!

Até justifico a posição do interlocutor. Eu mesmo, quando leio algo sobre determinado assunto, e noto a omissão de algo de que fiz parte, fico, até certo ponto, chateado. Um exemplo. Há alguns anos, li um livro do saudoso Pascoalino Assunção, esportista que era, sobre o futebol de Santo André. História de jogos memoráveis, principalmente do Corinthians de Santo André e do Primeiro de Maio, campeonatos da Liga Santoandreense de Futebol, da qual ele foi presidente durante inúmeros anos. História rica em detalhes, com resultados de jogos, equipes que se enfrentaram, com nomes dos jogadores. Sem dúvida, um rico documento preservando a memória do esporte, durante grande parte do século passado. Um valioso legado. Pois bem. Participei nos primeiros anos da década de 1950, de uma equipe formidável, o Juvenil Social Brasileiro. Era um clube de esquina, sem sede. Somente possuía dois ou três jogos de camisa, nas cores da seleção canarinha do Brasil, um saco onde as mesmas eram levadas, duas ou três bolas que nós, jogadores, comprávamos. Os calções e as meias, também adquiríamos, tudo em cores idênticas, para estarmos devidamente uniformizados. E um abnegado dirigente faz-tudo, o Américo Novella, que levava os uniformes para serem lavados, cuidava da parte administrativa, inscrições de jogadores na Liga, marcava jogos da equipe. Até, de vez em quando, tapava buraco, expressão usada quando faltava um jogador para completar a equipe.

Todavia, nossa equipe era formada por um grupo de muito bons jogadores. Enfrentávamos os juvenis do Corinthians e do C. A. Rhodia de igual para igual, apesar deles terem técnico, dia de treinamento, e outras condições de organização que não possuíamos. Participamos de campeonatos oficiais da categoria, promovidos pela Liga, não constando do livro do Pascoalino nem uma linha sequer sobre o Social Brasileiro. Fomos totalmente esquecidos. Paciência!

Outro dia encontrei um velho conhecido, que sempre o tratei como Guazzelli, não sabendo seu primeiro nome. Ou não me lembrando. Batemos aquele saudoso papo, dos tempos de meninos quando frequentávamos a Igreja Matriz. Virou ele para mim, perguntando:

- Lima, acho que jogamos futebol juntos, não?

- Sim, no time da Cruzada Eucarística.

Aí ele confirmou, citando o nome do Bruno, que era o organizador da equipe. Repliquei lembrando-lhe do goleiro Jesus, do Tite, zagueiro, e seu irmão Waldemar, ponta-direita, do Nadir, meia esquerda...e tantos outros.

Foi uma conversa muito boa. Depois de revirarmos páginas do passado, vem ele e me diz:

- Vamos fazer um trato?

Concordei:

- Sobre o quê?

- Vamos combinar em viver mais quarenta e cinco anos, disse!

Só pude me despedir dando uma sonora gargalhada!