É preciso punir?
O desastre do Costa Concordia nos mares da Itália me faz mais uma vez espantar-me com a volúpia de se querer punir quem, eventualmente, errou.
O erro começou com um gesto bem humano e simpático do capitão do navio.
Talvez até instado pelos passageiros para que se aproximasse o máximo possível de uma ilha para saudar os ilhéus.
Nada tivesse acontecido, e o Capitão seria visto como um bom homem e competente piloto de navio.
Desgraçadamente, o navio bate em enorme pedra e afunda. Pronto. O Comandante virou um dos piores homens da humanidade. De covarde, foi o mínimo que o chamaram. Espanta-me o rigor das apreciações negativas e sinto vergonha de dizer que não concordo com esse massacre a um ser humano que sofre ele também uma desventura. Digo vergonha, porque sei que todos temos sempre um impulso para procurar um culpado. Não nos livramos da síndrome da culpa.
Peço humildemente licença para dizer o que penso, senão teria que parar de escrever.
Vou contar uma para os amigos e amigas. Com dois anos de idade viajava eu, meu pai e minha mãe em um navio "gaiola", no caudaloso e enorme rio Amazonas. Viajávamos de Manaus para Belém. De noite, um breu que não se enxergava nada. De repente, desapareço das vistas dos meus pais. Pânico no pequeno navio. Ninguém me achou. Dado como afogado no grande rio, alguém se lembra de ir ao primeiro andar da embarcação, local de carga, ocupado por bois e vacas. Lá estava eu sentado, bem debaixo de um boi.
Tivesse eu morrido, pelo coice do boi ou vaca, ou caído no rio e me afogado, tenho certeza que o piloto do navio seria crucificado em vida. Mas garanto aos amigos que baixaria num centro espírita e faria a defesa do comandante. O que é que é isso, ele era Deus para garantir minha vida? Alguém, em sã consciência é garantidor da vida de alguém? Penso que não. Não estou falando de assassinatos, mas de infortúnios, quase sempre inesperados.
Vejo os desastres da vida, na sua grande maioria, como acontecimentos que sempre ocorrerão, por mais cautela que haja, porque simplesmente a vida é um risco permanente e não aceito a ideia que alguém é responsável pela minha vida.
De onde vem essa ideia de infligir mal físico a um ser humano, com castigo severo, prisão e outras coisas mais? Admito, isso sim, as reparações dos prejuízos causados pelos acidentes. Nos casos em que, provadamente, poderiam ser evitados.
A humanidade pode melhorar? Pode. Mas se ainda temos dificuldade em mudar a mentalidade de punição física, romper este círculo vicioso, estamos adiando indefinidamente nosso real progresso como seres humanos. Esta atitude de punir parece ser um atavismo milenar e não paramos para pensar que isto pode ser mudado. Avançamos quando rompemos com certos paradigmas. Este é um que amaria ver rompido de vez.
Peço desculpas a quem pensa diferente, mas sinto intensa necessidade de fazer esse gesto de solidariedade, aqui no meu espaço, para uma pessoa que nunca vi na vida e que nem sabia que existia. Chamo o Comandante italiano Schettini, dou-lhe um demorado abraço, choro com ele as vidas perdidas, digo que ele não é nem pior, nem melhor do que ninguém.
E mais: afirmo-lhe que ele é gente como nós e não precisa agradecer.
Com isso, sinto-me bem!
O desastre do Costa Concordia nos mares da Itália me faz mais uma vez espantar-me com a volúpia de se querer punir quem, eventualmente, errou.
O erro começou com um gesto bem humano e simpático do capitão do navio.
Talvez até instado pelos passageiros para que se aproximasse o máximo possível de uma ilha para saudar os ilhéus.
Nada tivesse acontecido, e o Capitão seria visto como um bom homem e competente piloto de navio.
Desgraçadamente, o navio bate em enorme pedra e afunda. Pronto. O Comandante virou um dos piores homens da humanidade. De covarde, foi o mínimo que o chamaram. Espanta-me o rigor das apreciações negativas e sinto vergonha de dizer que não concordo com esse massacre a um ser humano que sofre ele também uma desventura. Digo vergonha, porque sei que todos temos sempre um impulso para procurar um culpado. Não nos livramos da síndrome da culpa.
Peço humildemente licença para dizer o que penso, senão teria que parar de escrever.
Vou contar uma para os amigos e amigas. Com dois anos de idade viajava eu, meu pai e minha mãe em um navio "gaiola", no caudaloso e enorme rio Amazonas. Viajávamos de Manaus para Belém. De noite, um breu que não se enxergava nada. De repente, desapareço das vistas dos meus pais. Pânico no pequeno navio. Ninguém me achou. Dado como afogado no grande rio, alguém se lembra de ir ao primeiro andar da embarcação, local de carga, ocupado por bois e vacas. Lá estava eu sentado, bem debaixo de um boi.
Tivesse eu morrido, pelo coice do boi ou vaca, ou caído no rio e me afogado, tenho certeza que o piloto do navio seria crucificado em vida. Mas garanto aos amigos que baixaria num centro espírita e faria a defesa do comandante. O que é que é isso, ele era Deus para garantir minha vida? Alguém, em sã consciência é garantidor da vida de alguém? Penso que não. Não estou falando de assassinatos, mas de infortúnios, quase sempre inesperados.
Vejo os desastres da vida, na sua grande maioria, como acontecimentos que sempre ocorrerão, por mais cautela que haja, porque simplesmente a vida é um risco permanente e não aceito a ideia que alguém é responsável pela minha vida.
De onde vem essa ideia de infligir mal físico a um ser humano, com castigo severo, prisão e outras coisas mais? Admito, isso sim, as reparações dos prejuízos causados pelos acidentes. Nos casos em que, provadamente, poderiam ser evitados.
A humanidade pode melhorar? Pode. Mas se ainda temos dificuldade em mudar a mentalidade de punição física, romper este círculo vicioso, estamos adiando indefinidamente nosso real progresso como seres humanos. Esta atitude de punir parece ser um atavismo milenar e não paramos para pensar que isto pode ser mudado. Avançamos quando rompemos com certos paradigmas. Este é um que amaria ver rompido de vez.
Peço desculpas a quem pensa diferente, mas sinto intensa necessidade de fazer esse gesto de solidariedade, aqui no meu espaço, para uma pessoa que nunca vi na vida e que nem sabia que existia. Chamo o Comandante italiano Schettini, dou-lhe um demorado abraço, choro com ele as vidas perdidas, digo que ele não é nem pior, nem melhor do que ninguém.
E mais: afirmo-lhe que ele é gente como nós e não precisa agradecer.
Com isso, sinto-me bem!