AH, SE EU PUDESSE TE ABRAÇAR AGORA...

Amar é nobre.

Cresci decorando tal definição, mas meu coração teimava vagar pelo sótão da solidão.

O cupido me cutucou num dia dourado, quando vi pela primeira vez o esboço de Çabrina, sensualizando sorrisos para a assanhada clientela no balcão do Bar Salutar.

Rezava a lenda que a casta era de difícil diálogo, criteriosa e tremendamente exigente.

Hehe...nunca acreditei em lendas.

-Quer casar comigo?

-Se me pagar um drink eu topo!-disse, despojada.

Parecíamos um par perfeito!

Promovíamos travessuras carnais e devaneios conjugais.

Tirei a senhorita de beleza artesanal do acatingado cubículo em que residia e abriguei-a em meu curral.

A vida sofrida que Çabrina levava saturava seus contornos.

Mamãe adorou a decisão.

-Isso num vai prestá!-animou-nos.

Vivíamos enrabichados!

Um dia porém o Xassina, meu inimigo íntimo declarado, ousou xavecar minha imaculada dama:

-Delícia, delícia...assim você me mata!!!

Distribui bordoadas por toda a extensão facial do fanfarrão.

Fui algemado.

Ato abominável!

Crime inafiançável!!

Conduzido ao ócio da cela, me amontoaram entre uma milícia com vasta malícia criminal. Visando não incomodá-los, segui à risca as regras de etiqueta carcerária.

Só pensava em Çabrina!

Tatuei-a no braço...e na mente.

Aos poucos assimilei o dialeto prisional, adquirindo as manhas da malandragem e a confiança dos parceiros.

A Dadá, carcereira de doçura diabética, bambaleava o acentuado relevo glúteo pro meu lado. Os detentos perceberam o intento da guardiã.

-Mano, a gente já notamos!-me confidenciou o Dimaior, capitão do time do Xiz FC, preso ao tentar impedir que a polícia o impedisse de roubar um banco.

-Tô fora Dimaior, meu amor tá me esperando no mundão!

O sujeito suspeito me convidou para enfileirar o ataque de matadores do Xiz FC, finalista do Torneio Interno "Sôdapaz".

-Demorô!-concordei.

No domingo de visitas lacrimejei ao ver mamãe no pátio da prisão, com a cara carrancuda.

Ela descalçou os tamancos e me deu uma sova na frente dos "irmão".

-Cachorro, moleque! Eu num avisei?

A Dadá evitou a lesão dolosa.

-Calma sogra!-gritava, dadadando água com açúcar pra mami.

Acovardado, mantive velada a saudade de Çabrina.

Abusada, a Dadá intensificou o rico roteiro de assédios e entoou:

-Ai se eu te pego, ai se eu te pego...

Minha integridade sentimental permaneceu intacta.

Protocolei tratativas com o Criador em troca da presença de Çabrina em meu cativeiro. Postei centenas de cartas confiante na altivez do nosso nobre sentimento.

Nada dela dar as caras.

Sagrei-me campeão invicto defendendo o Xiz FC e tive o vulgo rubricado ao lado de grandes mitos da contravenção.

-É nóis!

O Dimaior, triste com meu tédio, insistiu em me animar:

-Convida a Dadá pra sair "ladrão"...hahaha.

-Tá me tirando, se liga truta, na próxima visita minha mina aparece!

Não barganharia o mais arrebatador dos sentimentos por instantes incompletos de volúpia.

O Domingo chegou!!!

Levantei antes que o sol, dei uma lavadela no calabouço e aguardei ansioso a presença da minha amada.

Eis que a Dadá me trouxe a resposta num envelope semi aberto.

-Eu falei, ela não me esqueceu...eu sabia, eu sabia!!!-propalei eufórico.

Ao abrir a missiva de Çabrina...

Convite de Casamento

Çabrina & Xassina

Não Perca!!!

Restou-me olhar para a compadecida Dadá e declamar:

-O jeito é dá uma fugidinha com você...

"O amor é um inocente, preso em flagrante".