A MACARRONADA DA QUEBRA ANZOL 

 

Cá estou novamente a ver dourar o alho sobre generoso fio de azeite, prestes a afogar certa porção de pequenos camarões. A receita, salvo acidente de percurso, deve chegar a uma deliciosa sopa.

O diabo é que o pessoal aqui não bota fé na minha culinária, cuja base é o bom e saudável azeite de oliva. Não vale, por ora, a última fornada de biscoitos de queijo que acabei de preparar usando-o, e não sei por que cargas d’água endureceram tanto.

“Biscoito de queijo com azeite, pai?... Estão iguais a pedras!” Surpreenderam-se.

“Pra que servem os dentes?”  Retruquei insolente e completei: “Se não os querem usar, peçam uma macarronada!”

Macarronada. Foi aí que me lembrei de Da. Ionita. Mãe de três amiguinhos, nos conduzindo a um casamento na fazenda  Quebra Anzol. 

Chegamos ao meio do almoço. Afoitos com as pessoas, tomamos as bênçãos ofegantes e fomos ordenados a sentarmos num relvado. Lá, seríamos juntamente servidos. Distraído, atrasei-me na busca por uma colher; ao preparar-me para sentar entre os três irmãos, lá estava, à minha frente, o Tonico e o seu nariz. Hão de me perguntarem: “Mas por acaso, seria sem ele?” Acontece que o nariz do Tonico não é um nariz qualquer. Explico: nele, no espaço abaixo das duas narinas, indo ao limite do lábio superior, formadas, duas faixas estreitas avermelhadas pelo corrimento constante daquela água “melenta” que, vez por outra era varrida pela língua.

Crianças brincam. A inocência e a simplicidade concorrem a um estado de aceitação das coisas infantis como elas são; meninos da minha época não especulavam muito, e assim, víamos tudo com a devida naturalidade. Então, nada daquilo que ora me chocava era-me estranho, quiçá, até familiar no contexto das correrias, dos banhos no Cascavel, até das caçadas de passarinhos na Santa Tereza, ocasiões em que nos bastavam  as frugalidades. Agora não.  A grande bacia de alumínio fora posta para comermos conjuntamente; nela, sobressaindo, o grosso macarrão de bote entremeado por fartos pedaços de frangos caipiras. Um cheiro de pimenta do reino espraiava longe assanhando a fome. Entretanto, se a boca enchia d’água livremente, não era pela saborosa baciada,mas, sobretudo, pelo nojo que o quadro me afligia. Não à-toa, meus olhos se erguiam à meleca do Tonico e desciam à bacia da macarronada, erguiam ao Tonico e baixavam à macarronada, vivenciando um transe de extremo nojo e angustiosa fome. Em tal catarse, o timbre da voz espichada de Da. Ionita chegava distante aos meus ouvidos: “Cooome Fernandinho!... Cooome!”

Eu não achava jeito.

A verdade é que eu não comi; contentei no decorrer do dia com alguns caroços de azeitonas e me virei com algumas frutas.

Bem, o que faço com esta colher de pau nas mãos?... Meu Deus! O alho deve ter esturricado!

Sopa? Depois dessa arrrghhhh!