Um programa de inutilidade pública
Grande polêmica no Big Brother Brasil, a qual parece ter vindo de encomenda após uma noite de excessos cuidadosamente programada. Sejamos práticos: se você selecionar um grupo de desconhecidos e tranca-los todos juntos em uma pequena penitenciária de luxo, com direito a toda tensão disfarçada de alienada descontração possível – a isto somando-se o regulamentar isolamento do mundo exterior ao qual os participantes do programa estão condicionados – e, culminando a inconseqüência do projeto, servir bebida alcoólica à larga aos prisioneiros ali mantidos – bem, digamos que esperar por atos no mínimo reprováveis da parte de alguns deles não será, em absoluto, bancar o profeta.
Assim como o transatlântico que naufragou ao se aproximar perigosamente da costa, a proposta do BBB ameaça ir a pique por aproximar-se demais da realidade. Top Shot, um reality show exibido pelo History Channel, talvez seja um dos melhores programas do gênero já produzidos. Por quê? Porque nele há uma proposta clara e um objetivo razoável, o que o torna interessante. Duas equipes de atiradores competem utilizando todos os tipos de armamento, de armas brancas a armas de fogo, passando por arcos e atiradeiras. O intuito do jogo é descobrir, através de provas que envolvem diferentes espécies de alvos (móveis ou imóveis), qual, dentre todos, é o melhor atirador. Os participantes também são confinados – mas, obviamente, não se permite que andem armados enquanto convivem, para evitar quaisquer imprevistos. Eles tampouco se embriagam.
Nosso Big Brother peca por sua completa falta de razão de ser. São os píncaros da irrelevância incoerente. O que afinal há de tão cativante em seguidamente observar o comportamento de pessoas sem qualquer atrativo interno, ou seja, que não possuem em sua grande maioria o mínimo grau de cultura, que tão apenas sabem festejar uma existência que mal compreendem entretendo-se com bebida, noites em claro e insuficiência intelectual? Sendo obrigadas a suportar a si mesmas e aos outros participantes da casa naquele ambiente inóspito e hipócrita, não é de estranhar que uma ou outra daquelas pobres cobaias movidas pela ganância acabe por perder a noção de seus limites. E talvez seja esse o objetivo do programa: uma experiência (des)controlada de dissolução moral, quebra de valores e decadência humana.
A verdade é que enquanto alguém perde seu tempo diante da TV deleitando-se com picuinhas, mexericos e atos reprováveis, poderia estar se relacionando com seu gato – o que certamente seria mais vantajoso, uma vez que o animal retribuirá com afeto o tempo com ele despendido. Ou poderia dar atenção a um filho, ou cuidar de algum idoso que precise. Enfim, ocupar-se de coisas realmente louváveis, que acrescentem algum orgulho ao fato de existir e fazer parte da humanidade. Porque, se a televisão em si já é um laboratório de inatividade, programas do feitio do BBB transcendem, inclusive, o poder e a utilidade da crítica.