Prostitutas de amanhã

     No nordeste, onde nasci e me criei, tal como acontece no resto do Brasil, a prostituição infantil há muito faz parte do dia a dia de suas capitais e não há como negar. 
     Digo suas capitais porque é nelas que o diabo desse crime é mais exposto e denunciado, porém, nem sempre punido com o rigor esperado. 
     Mas todo muito sabe que também nas grandes e pequenas cidades do interior, menores  são abusadas sexualmente e que punir o patife infrator não é coisa fácil; mormente se o indigitado tem um robusto saldo bancário.
     A televisão, em reportagens repetidas,tem mostrado garotas sendo abordadas por caminhoneiros inescrupulosos, nas margens das rodovias que cortam o iterior do nordeste, e elas a eles se entregando, atraídas por uma grana que às vezes só lhes permitem comprar um picolé de cajá. 
     Em alguns casos, diga-se a verdade, os pais são compulsoriamente coniventes: a tal "Bolsa família" mal dá para comprar o mulatinho ou o feijão de corda da semana.
     Um prato cheio para os estudiosos desse crime. Segundo eles, a pobreza extrema tem levado essas pequenas a venderem sua virgindade. Isso quando elas ainda não a perderam na mais tenra idade!
     Em outras palavras: apanhadas num desolador pauperismo, são molestadas por calhordas que com elas trepam adoidado e se vão sem pelo menos lhes dizer: Adeus!

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     Volto a este assunto - que não é novo - estimulado pelo que as gazetas andam dizendo sobre o que as autoridades pretendem fazer pelas garotas menores, durante o carnaval, tempo em que prevalece o salve-se quem puder. 
     Queria lembrar, que, no Brasil, a prostituição infantil não é coisa d´agora. 
     Patifes explorando meninas indefesas sempre existiram, tirando-lhes, muito cedo, o direito de serem inocentes; o direito de serem felizes.
     O poeta Olavo Bilac, em uma crônica escrita em 1894, já comentava: "E a cidade, à noite, continua a encher-se de bandos de meninas, que vagam de teatro em teatro e de hotel em hotel, vendendo flores e aprendendo a vender beijos."
     Conta o poeta, que certa noite, transitando "por horas mortas", no centro do Rio de Janeiro, encontrou uma garota que dormia na soleira de uma porta, quadro que lhe causara indignação e constrangimentos. E dela se apiedou. 
     Escreve, em seguida, o vate das estrelas: "Despertei-a. A pobrezinha levantou-se, com um grito. Teria oito anos, quando muito. 
     Louros e despenteados, emolduravam os seus cabelos em rosto desfeito, amarrotado de sono e choro.
     E dentro do miserável vestidinho de chita, todo o seu corpo tremia, como convulsão, nervosamente.
     Quando viu que não lhe queria fazer mal, o seu ar de medo mudou-se logo num ar de súplica. Pediu-me dez tostões, chorando."
     E confirma que deu a esmola, e seguiu seu caminho "com a morte na alma".

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     Meninas como a da crônica do Bilac continuam povoando, cada vez mais, as noites e as madrugadas brasileiras. 
     Ninguém quer que essas garotinhas sejam as prostitutas de amanhã. 
     Mas para que isso não aconteça, cuide-se delas, dando-lhes carinho, educação, instrução e uma ocupação rentável;
     E não apenas durante o carnaval, mas o tempo todo;  vinte e quatro horas. 
 

     

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 18/01/2012
Reeditado em 23/01/2012
Código do texto: T3447302