ACASO
Tudo que existe na natureza é obra do acaso.
O universo, o planeta que habitamos e tudo que o compõe como nós os seres humanos, somos obra do acaso.
Do mais puro acaso que o passar do tempo e a sequência das gerações tratou de modificar para melhor adaptar, de evoluir e muitas vezes involuir.
Os surgimentos e as extinções das espécies são originados desse movimento aleatório que a natureza faz indiferentemente, e que nós chamamos de causa e efeito.
E foi num desses acasos que eu conheci Márcia, virtualmente, numa dessas comunidades Orkut, “abertas a não membros”.
Havia um assunto num fórum que me chamou a atenção e eu postei minha opinião. Não lembro mais o assunto, mesmo porque já se vão mais de quatro anos do acontecimento, mas que por sua relevância voltei várias vezes, vendo o que os outros falavam e esclarecendo, quando necessário, o meu ponto de vista.
Márcia chamou a minha atenção pela riqueza vocabular e pela maneira segura com que defendia seu ponto de vista. Assim, procurei ver o que ela dizia nos outros assuntos.
Muitas vezes para provocar a sua reação, coloquei textos contrários ao seu ponto de vista, baseados em achismos corriqueiros, e ela replicava citando os teóricos que davam respaldo à sua opinião.
O passo seguinte foi por fora das comunidades, mantermos longas conversas sobre os mais diversos assuntos, desde literatura de cordel até a teoria dos fractais.
Nossos contatos tornaram-se hábito.
Nossas opiniões cruzadas nos fóruns das comunidades, às vezes complementares, às vezes diametralmente opostas.
Foi ela quem me indicou o Recanto das Letras quando leu um dos meus contos.
Para matar a curiosidade pedi seu telefone e liguei para ouvir-lhe a voz.
A vi uma vez pela web cam. Estava preocupada em prender o cabelo liso que naquele momento estava rebelde e insistia em não ficar onde ela queria.
E conversávamos, conversávamos sobre tudo, sobre a vida, a dela e a minha.
Mas naquele tempo, minha vida não era a vida que eu desejava para mim, era o tormento que eu decidi por um fim.
Num depoimento em minha pagina Orkut, Márcia agradeceu o fato de eu ter indicado o caminho para que ela “matasse os monstros” que povoavam-lhe a vida.
Ora, se eu podia aconselhar e mostrar alternativas para as outras pessoas, por que não experimentar do meu próprio remédio?
Foi o que fiz.
Alterei a rota da minha vida e hoje ela é completamente diferente de há dois anos.
Minha companheira de conversas, sempre ouviu tudo o que eu dizia, sem emitir opiniões de como eu devia agir, apenas perguntava:
- Você vai mesmo fazer isso? Está seguro que quer fazer assim?
E eu fiz.
Agora vivendo como havia planejado, achei que chegara o momento de agradecer pessoalmente àquela pessoa que sem ter consciência da importância do seu apoio nas longas conversas através do MSN (que ela me ensinou a usar porque eu ainda sou analfabyte) me ajudou a tornar minha vida prazerosa, digna de ser vivida, e a ser um homem feliz, de bem consigo.
Programei a visita com quatro dias de duração porque também queria conhecer a São Paulo que visitara tantas vezes, quando trabalhava, mas que não tive a oportunidade de ver nem mesmo os cartões postais.
Pedi que ela pesquisasse um local para minha hospedagem, com fácil acesso aos pontos que eu queria visitar e ela me disse que eu ficaria hospedado em sua residência e, em mais uma coincidência, ela havia pensado em me levar em todos os locais que eu elencara para as visitas.
No aeroporto, quando nos vimos, quando nos cumprimentamos com aquele beijinho rápido, quando nos abraçamos e sentimos o cheiro um do outro, descobrimos, ao mesmo tempo, o que até naquele momento não sabíamos, que nós nos amávamos.
Foi um momento mágico, paralisante, indescritível.
O mundo desapareceu em nossa volta.
Só nós dois existíamos envoltos num feixe de luz.
Nosso contato virtual nunca havia nos alertado para esse fato.
Márcia e eu estamos apaixonados um pelo outro e mais esse acaso natural, nos torna imensamente felizes.
Hoje, no ocaso da vida, posso dizer que estou adolescente outra vez, porque como diz a descrição do que é ser um Biólogo:
- Biólogo não se apaixona, sofre alterações hormonais...
PS: Márcia Adriana Barboza é também consóror recantista.