João das Cruzes (Parte I) - 16 de Janeiro de 2012
Céu escuro, sem horizonte algum.
Noite de aparição, mula-sem-cabeça, vampiros à solta.
Negras nuvens sobre o mar bravio.
Ondas se agigantando, crescendo ao encontro dos rochedos.
Flores rastejantes sendo levadas pela fúria das águas praia adentro
Ventos fortes e intermitentes fazendo as palmeiras levarem as suas palmas até o chão.
Trovões redundando sobre tudo apagando qualquer som da natureza em fuga.
Relâmpagos iluminando o cenário de minutos em minutos ofuscando a visão.
Um choro.
Gritos de dores.
Tempestade de pedras brancas feitas nas cores do algodão.
Telhados de zinco sendo jogados aos cantos.
O casebre gemia, mas do chão não deixava não.
Uma mãe gritava, mas do filho não largava mão.
Uma parteira espremia para ver por onde nasceria o filho do trovão.
Nestas horas o Homem tem as forças de um Deus oculto nas orações.
O Pai de João repetia sem parar ave-marias segurando com as costas as toscas tábuas do seu lar em demolição.
João das Cruzes nasceu com a cabeça ao vento.
Calou o mundo com o seu choro quando todos ajoelhados já pediam perdão.
Subitamente a tempestade passou.
Tudo se acalmou, o vento, o mar, a chuva, as dores, as orações.
Um lampião com luz tremulada ao vento mostrava João das Cruzes, ora sombra, ora luz parecendo hipnotizar a todos com a sua candura e bravura diante das batidas aceleradas de tantos corações.
***
Cedo se aprende a lição, o homem chora, gatinha, ri e chora de pequeno, mas na vida vira um anjo ou um demonhão.
Ou é indiferente a tudo e gira feito um pião.
Aonde afunda o pé, afunda o coração.
***
Parte II
Um berço de ouro
(próximo capítulo)