Complexo de Frankenstein
Jorge Linhaça
 
Uma das coisas sobre as que mais se fala ultimamente é sobre a necessidade de reciclar para não exaurir nossos  recursos naturais. Se pararmos para pensar, o barão de Frankesnstein foi o pioneiro da reciclagem, reciclando pedaços de cadávares para tentar dar-lhes vida criando , no seu entender, uma espécie de super-homem.
 
Hoje existe a necessidade de reciclar as idéias ou como preferem alguns, fazer um feedback de nossas ações e resultados.
 
Claro que o ser humano pretende estar em constante evolução e acredito que realmente precise repensar seus valores de tempos em tempos, o que considero bastante saudável, no entanto, o que podemos perceber é que parece que estamos mergulhados num grande complexo de Frankenstein, nos dois sentidos...o do cientista que buscava o poder de criar ( ou recriar) o homem qual Deus, dando-lhe vida depois de morto e o do monstro resultado de seu experimento.
 
Esse ser hibrido de cientista e monstro em que vamos nos tornando é o resultado da compulsão do homem por querer superar as gerações anteriores e quiçá o próprio Deus.
 
Estamos transformando a nós mesmos e a outras pessoas em uma verdadeira miscelânea de crenças e ideologias compostas de retalhos  das mais distintas filosofias e vertentes do comportamento humano.
 
O  ser "politicamente correto" vai agregando em si valores desconexos entre si e envolvendo-se no contraditório para estar bem com gregos e troianos.
 
É preciso lembrar que não estamos diariamente no 'Dia das Bruxas" ou no Carnaval...as máscaras e fantasias não podem ocupar o lugar de nossas faces e vestimen- tas.
 
Precisamos repensar se vale a pena retalharmos a nós mesmos e agregar aos nossos corpos , pedaços de outrem.
Não pretendo aqui fazer uma pregação apostólica mas é realmente necessário que reciclemos nossos valores, é preciso que resgatemos o que ainda pode ser resgatado ao invés de inventar novos rumos a cada dia.
 
Sem falso puritanismo, fico observando as pessoas falando sobre a escalada da violência, da criminalidade, da prostituição infantil, das drogas, da baixa qualidade da educação em nosso país, dos probelmas com o sistema de saúde sobrecarregado, da corrupção e da impunidade.
 
Tudo isso é verdade mas não vejo ninguém falar sobre a lascidão da moralidade, ou seja, vejo todos falarem dos sintomas mas ninguém , ou apenas alguns poucos, falam sobre a doença em si.
 
A frouxidão moral , se bem analisarmos, está no cerne de todos esses problemas, a licensiosidade em todos os sentidos está ligada ao quadro pré-apocaliptico que vemos no dia a dia.
 
Quando o homem perde o respeito por Deus, chamem-no pelo nome que for, não pode respeitar ao homem.
Quando os laços familiares viram coisa fora de moda, caretice ou o nome que lhe queiram dar, não se pode estranhar que as drogas, a violência, a doença, a criminalidade, a baixa-estima e a falta de educação ( em todos os sentidos) proliferem como animais nocivos ( qual ratos e baratas ) por falta de inimigos naturais que os controlem.
 
Quando o homem começa a levar a sério demais a crença no antropocentrismo, considerando-se o centro do universo e negando que exista algo acima dele, imerge num rio de águas profundas para o qual não está preparado para nadar e quando se dá conta, jaz atolado em um lodaçal que o impede de vir à tona e respirar.
 
Os antigos diziam que quanto mais se abaixa mais a bunda aparece...quanto mais rebaixamos os nossos valores e padrões mais ficamos expostos às vicissitudes
e tragédias da vida.
 
Sei que há quem considere o que estou dizendo um monte de asneiras, não importa, cada um tem direito á sua própria opinião e ao seu livre-arbítrio. O que as pessoas costumam esquecer é que o livre-arbítrio nos dá o direito de escolher o que fazer, mas não nos exime da responsabilidade por nossos atos nem das consequências do mesmo.
 
Quando crianças nossos pais sempre nos alertam sobre...não ponha a mão no fogo que você se queima, mas em dado momento lá vamos nós e metemos a mão em algo quente...só então passamos da idéia abstrata para o conhecimento concreto...
 
Não creio que seja por caso que as sociedades onde os valores morais são mais preservados são aquelas em que o desenvolvimento atinge todos os seus integrantes, são aquelas onde há menos pobreza, onde há menos criminalidade, menos doenças, melhor educação...
Já as sociedades onde os valores morais inexistem para a maioria da população o quadro é devastador.
 
Enquanto teimarmos em concordar com tudo e com todos, em aceitar que tudo é permitido , permitirmos que nos alinhavem pedaços de outras mentes ou corpos em nosso corpo sísico ou espiritual. continuaremos a caminhar em direção a um abismo e a nos lamentar pelas pedras no caminho.
 
Como não somos personagens do romance de Mary Shelley , não precisamos ter o mesmo fim de seus protagonistas...depende apenas de cada um de nós tentar libertar-se desse complexo de Frankenstein.
 
Somos seres únicos, não fragmentos ou cópias, somos seres pensantes, não apenas gravadores de idéias alheias...podemos sim ouvir todas as colocações, mas como ja dizia o apóstolo Paulo, examinai tudo e retende o que há de bom...o resto jogue no lixo.
 
Salvador, 12 de janeiro de 2012