"Ai, se eu te pego"

Quem tem os pés no chão e os olhos sedentos de mundo e de gente nada tem a reclamar de sucessos como Ai, se eu te pego. A música não tem compromissos firmados com isto ou aquilo, ou anteriormente aos grandes clássicos não haveria som. Cantavam os pastores das ovelhas desde sempre, cantam os marinheiros, os padres, os professores; cantam todos e de todas as idades e épocas. E infeliz de quem, mesmo desafinado, desista de cantar.

A música é convidada de todos os eventos, dos tristes aos mais festivos; dos profanos aos sagrados. Não se há de festejar o aniversário de uma criança ouvindo as sinfonias de Schubert ou as valsas vienenses. “Cada panela com seu texto” e cada hora com sua música.

Já li bastante sobre o Teló e deu pra saber que, desde menino, é ligado à música. Essa reclamação de pessoas meio macambúzias sobre tantos estarem cantando o Ai, que delícia chega a ser algo de uma tolice supina. Então deveria o cantor renunciar à sua juventude, alegria e oportunidade de sucesso profissional e econômico? Que mal ele está fazendo em dizer coisas tão simples como ai, se eu te pego, ai que delícia? Desde menina eu vi mães e avós correrem com a chinela para dar umas chineladas no bumbum de crianças muito vivas. E elas diziam: Menino, ai se eu te pego. Ah, sei também que os homens dizem isto pra prometer bons momentos às suas mulheres, mesmo que isto seja, vez por outra, propaganda enganosa. E como a mulher está mais livre, é a vez de ela olhar um homem que lhe agrada e dizer brejeiramente o mesmo refrão.

Será que reclamam por causa dos gestos que fazem Teló e todos os que cantam o seu maior sucesso? E daí? Estão esquecidos do que fez Madona? Estão esquecidos de Elvis e de Michael Jackson? Estão esquecidos da gafieira e do tango, inclusive de suas origens?

O ritmo de Ai, se eu te pego é de forró e isto aumenta mais ainda a vontade de brincar, de balançar o corpo, de dançar. E eu torno a perguntar: que mal há nisto? Que mal há em que pessoas de todas as idades se manifestem e sintam prazer, delícias e etc?

Se Teló é um fenômeno, eu não sei, mas o Ai, se eu te pego é, sim. E como tal é preciso ser visto e analisado. Cantam os espanhóis mais fortemente o Ai, se eu te agarro; cantam os de língua inglesa o Oh, If I Catch You. E agora, até os fingidos alemães querem também pegar; os poloneses idem. E até os soldados no Oriente. Os portugueses de Camões se esbaldam e os bicudos franceses enchem a boquinha com a versão criada pelos fãs do sucesso do brasileiro. Tem até em hebraico! Como se diz em Sergipe, “achou ruim, tire com um gancho”. E nós que falamos tanto de amor, de fim do preconceito e da intolerância e de paz, por que ficaríamos mal humorados em ver o mundo cantando e se deliciando ao som da musiquinha lúdica do Teló?

E se eu estivesse ainda nas salas do ensino médio, lidando com os adolescentes, daria aulas de língua portuguesa e de língua inglesa ao som do Ai, se eu te pego.