Velha foto de vovó e tia Irene em Canindé

Vi, por esses dias uma velha foto em preto e branco da minha avó paterna e ao lado dela a minha tia Irene. O retrato é antigo, deve ter uns cinqüenta anos ou mais, mas o que mais me chamou a atenção nele foi o motivo porque foi feito. Elas duas aparecem ao lado de uma imagem de São Francisco de Assis em Canindé, que é uma cidade cearense. Minha avó devia contar uns quarenta anos de idade e a tia talvez tivesse uns quinze. Haviam viajado para aquele santuário não por turismo mas sim para pagar uma promessa, agradecer uma graça. O preto e branco dessas fotos antigas conduzem-me a reflexões de perplexidade, vejo o rústico das roupas, dos objetos da época e sinto a austeridade como algo grave e pouco lírico. Hoje mais do que antes sou muito atento a observar imagens de pessoas em memoriais, galerias, antigos livros e até em cemitérios, minha imaginação tenta captar o sentimento daqueles que vejo retratados, sejam jovens ou adultos. Fico a imaginar o que estariam pensando no momento do retrato, e como seriam suas vidas naqueles tempos ainda muito duros, ou seja, pelo menos sem as muitas comodidades que usufruímos hoje.

Antigos retratos de pessoas, parecem transportarem para mim, o sentimento e parte da época em que foram feitos, enterneço-me diante deles e fico como que a rezar por aquelas pessoas que na maioria dos casos, já se foram pra outras paragens, se encantaram.

Ouvi muitas histórias acerca das aventuras de devotos daquela época. Andavam a pé, raro era o que possuía um animal para lhe servir de transporte. Naquela vez a minha avó foi com a minha tia de caminhão pau-de-arara. Os que faziam promessa para irem a pé, andavam por vários dias, semanas até para chegarem ao santuário de Canindé. A festa se dá no início de outubro, e por aquele tempo imagino como enfrentavam os empecilhos das estações, não era época de lagoas e lamaçal dos invernos, mas certamente era necessário encarar o estio com o seu calor desumano e a poeira das estradas de barro. Uma canção de Luis Gonzaga fala dessas viagens dos romeiros e o caso se bifurca para o lado feliz do amor: ai ai que bom, que bom que bom que é, uma estrada e uma cabocla com a gente andando a pé, ai ai que bom que é uma estrada e a lua branca no sertão de Canindé.

Meu pai foi batizado com o nome de Francisco, não sei se foi por promessa dos seus pais ou somente por devoção, e eu pergunto: quantos outros homens e cidades já receberam esse nome de batismo?

- Inúmeros são os Chicos no nosso Brasil e os Friscos lá pros ingleses, a grafia e a pronúncia podem até mudar, mas é o mesmo nome do santo, agora a fé dos devotos hoje, talvez não seja tão forte quanto à dos homens e mulheres do passado, eu vejo isso retratado na face e nos olhos da minha avó.