SOMOS DO SÉCULO PASSADO
Quando os cronômetros marcaram o primeiro segundo de 2012, taças se ergueram ao “tim tim" entre beijos e abraços, risos e lágrimas à celebração de um novo tempo. Em mim, a cada ano se processa mais intensamente essa desordem emocional. Por algum momento afasto-me de todos e, no voo da imaginação, a velocidade do pensamento leva-me às duas pontas da minha existência. É uma reflexão contemplativa, de dentro para fora, só minha, a envolver-me pela nostalgia do ontem e alegrias do agora. Isto compõe a minha história, que eu a revejo assistindo ao filme da minha vida.
O 12º ano do século XXI marca o novo tempo em que toda a minha existência há de projetar-se. Mas eu, igual à maioria dos que me leem, venho do século passado. Isto é espantoso para quem a contagem do tempo soma apenas anos; mas é fantástico para quem sabe vivê-los dando à própria vida alguns acréscimos.
Na virada do ano 2000 eu era “um rapaz novo encantado, com vinte e um anos de amor” quando, também, assisti à passagem do século. Ainda em plena juventude, não me sinto tão encantado com o novo tempo, mas venho repleto de amor desde o século passado. O ano 2000 parece haver encerrado um círculo de evolução criativa em que a humanidade viu no século XX seus últimos gênios.
Prematura talvez qualquer previsão para este século. Prefiro antever com os bons olhos do otimismo a ciência e a tecnologia, a arte e o crescimento intelectual, espiritual e humanístico, e disso tudo o respeito à natureza e sua preservação. Mas a primeira década deste século nada apresentou além de alguns avanços científicos e tecnológicos. Porém, nas artes em geral, tudo parece haver-se esgotado. É como se o campo da criação e da originalidade houvesse perdido a fertilidade, incapaz de produzir novos gênios. Quem por alguma razão nele se destacou certamente não o fez pelo ineditismo, mas por “nova roupagem” ao que já fora criado.
Na música, salvo a instrumental com o surgimento de alguns talentos na execução, tudo mais parece haver se esgotado na borra do século XX. Já não há bons compositores. Cantores e cantoras surgem a todo instante, mas raramente se vê uma autêntica interpretação. Os que não se submetem ao lugar comum da mesmice apelativa e consumista regravam sucessos antigos, pérolas do passado, sem nada a lhes acrescentar além de arranjos e técnicas de gravações sofisticadas. O Brasil é o país das cantoras, mas nenhuma marcou a primeira década deste novo século. Maria Rita não conseguiu ultrapassar o grande marketing que a lançou. Canta bem. Fora disso, é uma cantora a mais entre muitas. Rita Ribeiro, que parecia prometer ao regravar “Oração ao Tempo”, de Caetano Veloso, perdeu-se na trilha umbandista de que fez parte metade da carreira de Clara Nunes. Rita Ribeiro se veste a caráter para cantar e dançar ao som de atabaques, bombos e agogôs, levando ao palco o ritual do candomblé. Longe ela está de Clara, quão distante está Maria Rita da mãe Elis Regina. O rock brasileiro morreu. O que subsiste é cópia ao estilo J Quest. O samba cedeu lugar ao pagode e os grupos cantam em uníssono, sem nada que os distinga além dos nomes. O Forró se urbanizou eletronicamente em bandas “com”, a partir do Mastruz com Leite. O mesmo se deu com a música sertaneja.
A literatura padece da mesma letargia. Nunca se publicou tantos livros e talvez nunca se tenha lido tanto. Mas nenhum lançamento conseguiu projetar nacionalmente um escritor, de modo a despontá-lo como expressão literária neste princípio de século. Tudo ainda repousa no berço antigo. Até mesmo as criações científicas e tecnológicas de que se servem as artes em geral levam-me a crer como se ainda estivesse no século passado, de que eu, e quase todos que me leem, somos.
Ouça>
http://www.youtube.com/watch?v=O2P1khIyTX8
http://www.youtube.com/watch?v=dtBA2vGJqM8
(ORAÇÃO AO TEMPO - Maria Bethânia).
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Em férias, viajando a partir de amanhã, um abraço a todos, renovando-lhes meus votos de um feliz 2012.
Quando os cronômetros marcaram o primeiro segundo de 2012, taças se ergueram ao “tim tim" entre beijos e abraços, risos e lágrimas à celebração de um novo tempo. Em mim, a cada ano se processa mais intensamente essa desordem emocional. Por algum momento afasto-me de todos e, no voo da imaginação, a velocidade do pensamento leva-me às duas pontas da minha existência. É uma reflexão contemplativa, de dentro para fora, só minha, a envolver-me pela nostalgia do ontem e alegrias do agora. Isto compõe a minha história, que eu a revejo assistindo ao filme da minha vida.
O 12º ano do século XXI marca o novo tempo em que toda a minha existência há de projetar-se. Mas eu, igual à maioria dos que me leem, venho do século passado. Isto é espantoso para quem a contagem do tempo soma apenas anos; mas é fantástico para quem sabe vivê-los dando à própria vida alguns acréscimos.
Na virada do ano 2000 eu era “um rapaz novo encantado, com vinte e um anos de amor” quando, também, assisti à passagem do século. Ainda em plena juventude, não me sinto tão encantado com o novo tempo, mas venho repleto de amor desde o século passado. O ano 2000 parece haver encerrado um círculo de evolução criativa em que a humanidade viu no século XX seus últimos gênios.
Prematura talvez qualquer previsão para este século. Prefiro antever com os bons olhos do otimismo a ciência e a tecnologia, a arte e o crescimento intelectual, espiritual e humanístico, e disso tudo o respeito à natureza e sua preservação. Mas a primeira década deste século nada apresentou além de alguns avanços científicos e tecnológicos. Porém, nas artes em geral, tudo parece haver-se esgotado. É como se o campo da criação e da originalidade houvesse perdido a fertilidade, incapaz de produzir novos gênios. Quem por alguma razão nele se destacou certamente não o fez pelo ineditismo, mas por “nova roupagem” ao que já fora criado.
Na música, salvo a instrumental com o surgimento de alguns talentos na execução, tudo mais parece haver se esgotado na borra do século XX. Já não há bons compositores. Cantores e cantoras surgem a todo instante, mas raramente se vê uma autêntica interpretação. Os que não se submetem ao lugar comum da mesmice apelativa e consumista regravam sucessos antigos, pérolas do passado, sem nada a lhes acrescentar além de arranjos e técnicas de gravações sofisticadas. O Brasil é o país das cantoras, mas nenhuma marcou a primeira década deste novo século. Maria Rita não conseguiu ultrapassar o grande marketing que a lançou. Canta bem. Fora disso, é uma cantora a mais entre muitas. Rita Ribeiro, que parecia prometer ao regravar “Oração ao Tempo”, de Caetano Veloso, perdeu-se na trilha umbandista de que fez parte metade da carreira de Clara Nunes. Rita Ribeiro se veste a caráter para cantar e dançar ao som de atabaques, bombos e agogôs, levando ao palco o ritual do candomblé. Longe ela está de Clara, quão distante está Maria Rita da mãe Elis Regina. O rock brasileiro morreu. O que subsiste é cópia ao estilo J Quest. O samba cedeu lugar ao pagode e os grupos cantam em uníssono, sem nada que os distinga além dos nomes. O Forró se urbanizou eletronicamente em bandas “com”, a partir do Mastruz com Leite. O mesmo se deu com a música sertaneja.
A literatura padece da mesma letargia. Nunca se publicou tantos livros e talvez nunca se tenha lido tanto. Mas nenhum lançamento conseguiu projetar nacionalmente um escritor, de modo a despontá-lo como expressão literária neste princípio de século. Tudo ainda repousa no berço antigo. Até mesmo as criações científicas e tecnológicas de que se servem as artes em geral levam-me a crer como se ainda estivesse no século passado, de que eu, e quase todos que me leem, somos.
Ouça>
http://www.youtube.com/watch?v=O2P1khIyTX8
http://www.youtube.com/watch?v=dtBA2vGJqM8
(ORAÇÃO AO TEMPO - Maria Bethânia).
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Em férias, viajando a partir de amanhã, um abraço a todos, renovando-lhes meus votos de um feliz 2012.