O ano do cometa e de Xangô

     Entrei em 2012 olhando para o céu!
     Juro que não foi aplaudindo os foguetes coloridos que invadiram o espaço estrelado, saudando o ano que acabava de nascer.
     Em Salvador, foi um "bombardeio" que durou aproximadamente vinte minutos, mexendo com os nervos dos puldos e pinchers do meu prédio.
     Nada assusta mais nossos cães do que o estampido produzido por um foguete. 
     Criei um Dobermann, cão de guarda temido e soberbo, que se acovardava ao ouvir o pipocar de um inofensivo traque, na noite de São João.
     Latia desesperado, ou perdia a voz.

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     Muito bem. Assisti a virada do ano eufórico e ao mesmo tempo tenso. Tão tenso que os amigos mais próximos, estranhando minha indissimulável inquietude, quiseram saber o porquê de tanta preocupação, e eu lhes não disse.
     Acostumados a me verem palavroso e ridente, não entendiam por que, justo do Rèveillon, eu ficara calado e sorumbático.
     Cada um procurou explicar ou justificar o meu momento de ostensiva melancolia, apesar da alegria reinante dos quatro cantos da Terra pela chegada do ano novo.
     Houve quem dissesse que eu estava escondendo uma doença que poferia ou deveria  agravar-se em 2012.
     Houve que me visse atravessando uma séria crise financeira, com problemas no meu saldo bancário e repetidos confrontos com credores.
     Houve - pasmem! - até que divulgasse que eu me encontrava com o coração dilacerado pela perda inesperada de um velho amor... Em outras palavras: estava-se diante de um cara atingido por uma infame e cruel dor de corno.
     Suposições, todas elas, fora de cogitações.

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     Começo dizendo, que recebo dos cofres públicos, sem gatunagem, o bastante para manter minhas contas rigorosamente em dia. Credores? Não os tenho.
     Meu saldo bancário vai bem, obrigado. 
     Reforçado, mensalmente, e com a maior transparência, por meus proventos que, com o passar dos anos, tornam cada vez mais difícil meu merecido descanso; o descanso de um honesto jubilado.
     Nada de esconder ou negar doenças. Tô inteiriiinho! Neste item, reafirmo, aqui, que me sinto lesado todas as vezes que tenho que pagar os famigerados "planos de saúde", aos quais compulsoriamente aderi.
     Dor de corno? Não tenho motivos para sofrer por amor... As mulheres que me querem bem sabem demais que desse mal não padeço, todas elas responsáveis por esta minha invejável estabilidade sentimental.

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     Meu Rèveillon foi tenso por um motivo que para o leitor parecerá uma piada.
     Não foram as previsões das astrólogas, cartomantes e tarólogas da Bahia - "2012 será um ano de catástrofes" - que mexeram comigo.
     Segundo elas, virão mais ( eu disse mais) escândalo, violência, doenças e crises econômicas.
     A partir, pois, do que dizem os Terreiros baianos, concluo que, em 2012, o caos se instalará inevitavelmente, na Bahia e no Brasil.

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     Como disse, o motivo que me deixou  tenso no Rèveillon, obrigando-me a não arredar os olhos do céu, foi outro, e não deem risadas.
     Pensei em mantê-lo em segredo. Até para não levar o pânico àqueles que perdem seu tempo lendo as asneiras que saem da minha inculta pena.
     Convencer-me de que devia dividir com os meus leitores as preocupações que me assaltaram no limiar de 2012, não foi fácil.
     Contei em crônica recente, que três cometas gigantes deveriam cair sobre a Terra, resultado de leituras sobre eles. 
     O  que aconteceria com o mundo com a queda desses misteriosos astros, não foi prognosticado. 
     Um cairia em 2006, o outro em 2010 e o terceiro em 2012. Os dois primeiros não deram o ar da sua graça. Restou o terceiro, que deverá cair em 2012; quando, ninguém sabe. 
     Este foi o verdadeiro motivo da minha marcante inquietação no último Rèveillon.
     Esperava que ele surgisse nos primeiros segundos do novo ano.
     Os cometas, embora o padre Antônio Vieira os tenha chamado de "vozes de Deus", sempre estiveram na mira dos astrólogos, astrônomos e renomados matemáticos. 
     Bem como na literatura: na prosa e na poesia. 
     
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      Lembro-me de ter visto, apenas, um cometa, em toda a minha vida. Na época, meados do século 20, dizia-se aos terráqueos ingênuos que seria o fim do mundo, caso sua calda tocasse, ainda que de leve, na face da Terra.
     Rezei muito. Oh! o quanto valem as orações de uma criança! Nada aconteceu.
     Não sei se hoje as orações deste mísero pecador evitarão que o cometa gigante que se aproxima, prometido para 2012, carregue, no seu rabo flamejante, este sofrido mundo, decretando o final dos tempos. Rezemos.
     Por fim, acreditando na Ialorixá Ivanete Silva Matos, do terreiro Ilê Yá Omim Axé, de Salvador, que assegura ser 2012 o ano de Xangô, penso que tiraremos de letra as turbulências anunciadas para este ano.
     Afinal, Xangô é o Orixá da Justiça.
     Acautelem-se, sim, os transgressores, pois, segundo a Mão de Santo Ivanete, "as pessoas serão cobradas pelos seus erros".
     Kavó Kabiesilé!!!
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 02/01/2012
Reeditado em 02/01/2012
Código do texto: T3418946