Ser o que somos
O que seria do azul se todos gostassem do branco! (Dito popular)
“Árvore do Amor” é um filme de sorrisos tão bonitos que passei a maior parte de quase duas horas de exibição pensando em como a natureza é generosa com algumas pessoas. Não há como tirar os olhos dos dentes brancos, do amor borbulhando de todas as formas. A cena do abraço simbólico é simplesmente espetacular. Mesmo de longe, cada um nas margens opostas do rio, eu conseguia visualizar-lhes o sorriso, desta vez tímido.
Hoje levo meu melhor pensamento e sorriso para bem longe. Quando meus filhos sugeriram que ficássemos juntos neste Natal, em um lugar distante, pensei que estivesse sonhando. De dois mil para cá, pudemos passar a noite de Natal juntos apenas uma vez. Morar longe, trabalho, plantão, distancia, sempre havia algo. Nossos Natais passaram a ser comemorados no dia 2 de dezembro, no dia 5, no dia 10, mas nunca no dia 25. Cada um tem sua própria família e as cidades muito distantes umas das outras.
Isto não é diferente em grande parte das famílias, hoje.
Quando vi Belém de tantas luzes, a muitas horas de meu lugar, confesso que esperava encontrar uma cidade pequena e fiquei surpresa, encantada. Pelo contrário, é uma metrópole, linda e respira cultura. Os casarões são magníficos e a maior parte deles é conservada com mãos de fadas e duendes. As mangueiras ladeando as calçadas são incríveis. Não sei se os carros são segurados para queda de mangas sobre eles, mas que dá vontade de catar as que caem no chão e sentir-lhes o sabor, isso dá!
Antes de chuva ou depois da chuva, posto que a chuva caia todos os dias, descobri que lá não existem as estações do ano, apesar da natureza ser magnífica, verde, exuberante, bela! Enquanto eu me derretia de calor, a vida transcorria para todos com a simplicidade de ir até a esquina comprar pão.
Só quem pode conhecer a cidade e respirar a sua cultura sabe do que falo. Entrar na Basílica de Nossa Senhora de Nazaré muda o pensamento! É linda e a presença de Deus é facilmente notada, até para quem não acredita. A praça que circunda a Basílica é pequena e ouvi dizer que os pés das pessoas não alcançam o chão durante o Círio – são literalmente levados pela força da "gravidade da fé".
Entrar no Museu de Arte Sacra – para meu alívio, salas com ar condicionado a todo vapor e muito escuras, para conservar as obras, encantam os olhos de quem as visita. Ter sensação estranha ao entrar numa cela de alguns metros quadrados, com uma exposição de peças utilizadas na prisão faz com que os mais sensíveis queiram sair correndo de lá. Apreciar os canhões, a orla do rio, o maior mercado em céu aberto da América Latina – Ver o Peso – estar muito perto dos grandes jarros onde eram colocados os ossos dos índios, respirar de paixão ao ver o por do sol de Belém, encantar-se com guarás coloridos. Sentir na pele a sensualidade das danças. Tomar todos os sorvetes deliciosos. Conhecer frutas que jamais imaginamos que existam. Comer macarrão com camarões minúsculos.
Sentir nosso mundo apenas guardado num cantinho do pensamento e vivenciar este novo mundo; é o que importa, com as asas abertas para as minhas crias.
O encontro com a índia de verdade foi algo que vou levar sempre comigo. Muito pequena, vendedora de cocos. Meticulosa ao nos atender, carinhosa. Ela nos contou que usou roupas pela primeira vez quando tinha onze anos e ainda tem extrema dificuldade de viver na cidade. Assim como eu, que nunca tinha visto a pele magnífica do índio, ela nunca havia tido uma demonstração de carinho tão grande como a nossa. Tiramos fotos juntas, ela nos mostrou o açaí in natura. Ao despedir-me dela, apenas pude ler “Deus te abençoe” pela leitura dos seus lábios.
Com exceção das longas horas de engarrafamento, o que nos impressionou – parecia uma cena de filme de ficção – tudo foi perfeito.
Por alguns dias magníficos meu sorriso ficou bem parecido com o do casal de namorados de “A árvore do Amor”.
Feliz Novo Ano... Domingo de 1 de janeiro de 2012.
Fotos by RLóra