O AMOR EM TEMPOS DE AMAR

Por Carlos Sena



 
O amor, por ser eterno é meio etéreo. Por ser semente não se-mente. O amor por ser mor não se aparta: a-mor. O amor é indo e voltando e invertido dá aroma. Vai ao infinito como vai a Roma, cria limo e cria rama. Não se faz amor com arma, nem sopa de letras em vão. Vão-se do amor os anéis, os dedos não. As rimas do amor podem doer como dor pode queimar como ardor. Não seriam do amor sem o sofrer, posto que viver sem ele não é viver, mas se beira o quase morrer. O amor é o tempo imenso e minúsculo. Dura um segundo em eternidade: e-terna-idade. Na terna idade se abstrai de si para o etéreo, sob o lombo largo do Pégaso que a vida nunca sabe seus mistérios decantar.

O amor não tem lógica e tem todas. A lógica do amor é a falta dela, mas é também a completa razão dos sem razão, dos sem vez, dos sem voz. A vez do amor é sempre a que não se espera. A espera do amor é sempre extenuante, devido aos mistérios que só quem é tudo e nada ao mesmo tempo provoca. Há provocações, certamente, no amor. A maior delas é a vocação de camaleão atribuída ao próprio amor. Quando ele dá prazer é plenitude, quando provoca dor, inquietude. Quando se torna indefinido, o limbo existencial se estabelece sem cor, qual estrelas que não vemos, qual velas acesas sob a mesa da sala de jantar. O manjar dos deuses não se alimenta dos nossos caprichos. Sendo o amor um pouco desse manjar, talvez a gente tenha que primeiro merecê-lo, para depois degluti-lo. A degustação da vida tem tudo a ver com a infusão do amor em nossas vidas. Do gesto das mãos no afagar do afeto às tristes sobras do aceno que acompanha o amor no gesto funéreo da despedida. Deixar-se por quem se ama é ruptura sepulcral: é como se o sol virasse sombra e a sombra perdesse o sentido do abrigo para nossos cansaços.

Quando o amor se vai, a gente pensa que o horizonte termina ali, onde o morro alcança nossa vista e onde a luz nem parece mais ter abrigo pra se esconder. Mas ele não se perde em si. Aliado ao tempo se rebusca em sabedoria e não nos abandona ao vazio. O vazio do amor, por ser dele, parece não ser vazio, mas cheio de desilusões como que esperando o renascimento de novas outras ilusões. Estas, sendo do amor, não se submetem aos caprichos humanos – revestem-se sempre do ideal do viver maior sob vários aspectos da existência: o amor fraterno, o amor homem e mulher. O amor assexuado. Amor adulto, amor astuto, amor amado. Amor de fé, amor Zeus, amor de uns, amor de Deus. Rama do amor que Roma não quis armar, pela falta de rama nos corações âmbar. Samba não é sambar. O ritmo do amor é amar: há mar no intimo dele senão o liame entre amor e infinito não aconteceria no horizonte.
 
Ontem tudo era belo
Hoje nem sei se sinto.
Ontem tudo era prelo
O amor que por ele sinto.
Ontem na casa inteira havia passos.
Hoje em cada canto, apenas rastros.
Ontem o amor fugiu pela fresta da telha
Hoje pela brecha da porta
A natureza morta estava viva
E viva em mim estava a vida... Ávida.
 
Assim. Pode ser. Quem sabe? Será? Vejamos! Até um dia? Até talvez? Até... Quem sabe? Só o amor poderá nos responder... Ou não!

Feliz natal. FÉ-LIZ NATAL. Um anão. UM ANO GRANDE. Um grande amor. Nunca um grande ardor.