VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

Hoje pela tarde, me detive em assistir o noticiário, coisa que faço com um prazer quase infantil, e chocou-me novamente como a barbárie ganha espaço no cotidiano do brasileiro. Cenas de violência contra a mulher eram exibidas no padrão jornalístico, seguida de comentários de repudio e de tristeza dos familiares das vítimas. Impressionou-me, mormente o caso de uma moça cujo namorado inconformado com o fim do relacionamento, a convida para um encontro, onde tratariam do fim do namoro. A moça sem esperar pelo pior atende ao chamado do ex- namorado aceitando em encontrar-se com ele. O encontro resultou no golpe a facada que ceifou a vida da jovem de 25 anos. O rapaz calmamente sobe na caminhonete e vai embora deixando a vítima agonizando no chão. Toda essa seqüência de eventos foi flagrada pelas câmeras de um circuito de segurança.

De todo esse relato o que mais choca é a previsão legal de que esse indivíduo possa responder ao processo em liberdade, uma vez que o mesmo não foi pego em flagrante delito, e por apresentar residência fixa e laços laborais. Essa aberração legal levou meu colega Wesley, aluno do 8º período de Direito como eu, a expressar revoltadamente ao ver a reportagem: “Na próxima encarnação quero nascer bandido”. o desabafo do meu companheiro de classe reproduz fielmente o que as pessoas de bem de nosso país pensam da justiça e da lei. É um sentimento de que a lei, mais de que em qualquer época, perversamente contribui para a delinqüência e a criminalidade. É nesse terreno duvidoso e lascivo da legislação brasileira que os mais vis casos de barbárie tornam-se freqüentes, e lentamente acabam ingressando no inconsciente coletivo como algo comum, até que por fim atingiam o status de banalidade conformista.

É contra essa conformação de que nada possa ser feito é que devemos lutar, não podemos jamais dentro de um Estado Democrático de Direito, praticarmos o retrocesso em matéria legal, há que se perceber que a lei não é um fenômeno em si e per si, mas trata-se de uma instituição humana que deve zelar pelo bem mais precioso que todo ser detém: “a vida”. E quando a lei serve a interesses que divirjam dessa perspectiva é preciso ser nítido para nossos legisladores e para nós que aceitamos o “pacto social” de Rousseau que algo deve ser feito. Não se pode virar as costas para essa falência institucional, para esse escândalo que põe em cheque a credibilidade do Ordenamento Penal brasileiro. Hoje mais do que nunca é o momento propício para se rediscutir o que queremos preservar em matéria de Direto sob pena de involuirmos legalmente no médio prazo.

Todo aquele protecionismo forjado no calor da Constituição de 88 teve seu lugar como uma forma de se resguardar dos tentáculos da fera que era a ditadura militar, contudo hodiernamente não há que se falar em cerceamento de direito, não há mais um mostro do qual devamos nos proteger construindo uma couraça legal para isso. É o tempo da democracia plena em que erige as leis do nosso país, por isso torna-se ridículo esse protecionismo legal aos infratores e mal- feitores sociais. É preciso coragem, como diz a música para mudar toda essa conjuntura perversa que torna as pessoas de bem reféns da marginalidade tendo que se acuarem dentro de suas casas para escapar daqueles que impunemente trafegam pelas vias do Estado do tudo posso e do oba- oba.

À família dessa moça que tragicamente perdeu a vida, resta, pois chorar um pranto amargo e dormir com a certeza caótica de que pouca coisa será mudada em matéria de direito no curto prazo, e que certamente outras jovens serão violentamente levadas pelas mãos assassinas dessa geração que acredita que a vida é um vídeo game onde o mais esperto tudo pode. Lastimosamente deixamos nosso pesar e consternação.