TURISMO E BURACOS NO ASFALTO

Sempre viajava a noite de Belo Horizonte para Viçosa -MG. A estrada era muito sinuosa. Depois de ter passado por Ouro Preto e por Mariana, continuávamos o percurso. A estrada continuava com muitas curvas. Uma sinuosa cobra sorrateira. Aprendi fazê-las com destreza, afinal trafegava por um longo tempo na estrada. De repente, me distrai com a conversa, iniciada por minha companheira. E pronto, lá estava um buraco na pista. Pelo tamanho do barulho, ela deveria ter um metro de diâmetro. Pelo menos tive a certeza que o buraco não era mapeado. Isso mesmo leitores. Afinal, não tinha nenhum pedaço de arbusto informando, o seu tamanho. Também, não apresentava nenhuma bananeira plantada. Isso mesmo é uma técnica rudimentar usada lá no sul de Minas para identificar buracos na estrada.

- Não precisa nem comentar o que aconteceu!

Como esperado, o pneu furou e entortou a roda de ferro. Checando as horas, percebi que já eram 00:40 minutos.

- Tudo bem! E só descer do carro e trocar o pneu. Afinal, faltavam apenas 35 km para chegar ao meu destino.

Era uma escuridão total. Liguei o pisca alerta, dava para ver os grilos e outros seres noturnos no asfalto.

O melhor disto tudo, foi ter que retirar toda a bagagem do porta malas. O pneu estepe do meu carro ficava debaixo das malas, dá para acreditar? Ah, coisas da Volkswagen!

Tomei todas as medidas de segurança. Sinalizei a pista com o triângulo. Afrouxei os parafusos da roda esquerda dianteira. De posse do macaco, comecei a minha eterna penúria de levantar o carro. Até, este momento, segui os meus instintos de borracheiro. Pois de louco e borracheiro todo mundo tem um pouco. O carro estava quase tocando o céu estrelado, quando percebi que era o momento de parar com o macaco. A luz do pisca alerta continuava intermitente noite adentro.

De repente, escuto o barulho de ferraduras, tocando o chão num coro tedioso e triste. Pensei! Não deve ser nada, apenas algumas ferraduras soltas de algum cavalo pangaré. Com a aproximação, percebi que era apenas um cavaleiro, destes que moram em fazendas ou sítios próximos as rodovias.

- Ah, no meu pensamento, o cavaleiro lembrava São Jorge e o dragão, então este só pode ser do bem.

- Que maldade um cavaleiro pode fazer a um trocador de pneus? Sussurrei para a esposa.

De repente, aos gritos, bradou o cavaleiro, com uma voz trêmula e embriagada! Parecia que bebera todas e mais algumas.

- Quem taí agachado piscando? É o marciano que roubou as minhas galinhas na noite passada?

Percebendo que o cavaleiro estava embriagado, não dei confiança. Afinal, marciano e ladrão de galinhas não combinava comigo! Pagava todos os meus impostos! Que situação constrangedora! De qualquer forma, ele poderia tentar alguma coisa comigo. Para mostrar que a situação estava sob controle, respondi com voz alta.

- Está bem, tudo tranqüilo.

- Você está sozinho? Perguntou o cavaleiro.

- Não.

- Então, vou matar você na boa! Não gosto de marcianos e nem de ladrão de galinhas!

Pensei no marciano, pois pagava excessivos impostos e não tinha nada em troca do estado. Apenas o buraco na pista. Só posso ser marciano mesmo! Peguei a chave de roda, soltei os parafusos quentes da mão, e fiquei esperando pelo pior. Sabia que se ele não tivesse um revólver, teria um facão destes que ficam na bainha do arreio. Minha esposa, aos prantos dentro do carro, fitava a situação. E que situação! ... Enquanto o pisca alerta continuava. Nestes momentos pensamos em tudo, mas o que me veio à cabeça foi à idéia de não viajar mais à noite. Também prometi para um santo católico, que se saísse desta situação, plantaria uma bananeira no buraco. Os marcianos têm que fazer algo contra os buracos nas rodovias. Estava disposto a contribuir com o estado, cultivando uma bananeira. Seria um pé de banana nanica. Existe uma preferência nacional por essa espécie. Vejam só! Existem mais de quinhentas variedades de banana! Mas queria um pé de banana nanica que é do grupo Cavendish. Os leitores devem se perguntar é difícil cultivar bananeiras. Pois bem, dizem os especialistas em bananeiras, que elas sofrem ataques dos fungos. Pelo menos não é de um cavaleiro.

Pois bem, voltemos à nossa estória. Matar na boa, o que deve ser isto? Como seria matar de outra forma, que não seja na boa? Como será o sangue um marciano? Comecei com os meus pensamentos soltos. Agora não conseguia raciocinar, pois não é toda noite, que essas coisas acontecem. O cavaleiro continuou insistindo.

- Vou matar você na boa! Só tenho um facão, muito mal amolado.

- Acho que marciano grita muito antes de morrer.

Grita sim, para que altere a tabela do imposto de renda, seu cavaleiro duma figa! Pensei. E o cavaleiro insistindo

- Continua piscando, essa luz, que vou buscar meu revólver.

Respirei com alívio, pelo menos não precisava devolver as galinhas roubadas. Pensei se for embora, dá tempo de trocar o pneu. Isso mesmo, leitores! Teria tempo para trocar o pneu rapidamente, pois meus instintos de borracheiro estavam aflorados. O cavaleiro continuou insistindo.

- Se você terminar rápido com a luz, você me procura lá embaixo, só dar marcha ré na nave. Vou matar na boa! Gosto de revolver. O facão vai demorar muito para sangrar, marciano!

Troquei o pneu rapidamente e segui minha viagem. Mais aliviado, comecei a pensar na devolução das tais galinhas. Comentei, com a minha esposa, se precisássemos, onde conseguíramos galinhas naquela hora da noite. É, depois de passado o desespero, pensamos de forma melhor. Agora pensava nas galinhas, quantas seriam, na cor, dentre outras características. Quer saber? Esqueçam as galinhas! Continue a minha viagem. Ah! Fui rodando mesmo, só para contrariar. Estava convencido que era um marciano.

De lição, aprendi que não vale a pena cultivar bananeiras, dá muito trabalho, principalmente com os fungos. Pelo que entendi dos especialistas em bananeiras, é melhor cobrar um asfalto melhor, a redução da tabela do imposto de renda, dentre outras coisas do estado. Afinal, um marciano deve ter o direito de andar com a sua nave por ai.

Osório Antonio da Cunha
Enviado por Osório Antonio da Cunha em 07/01/2007
Reeditado em 12/05/2007
Código do texto: T339183
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