ETERNA FLAMA

Li certa vez, em papel chamuscado, uns versos afagos de Aracy Martins, algo semelhante a uma Adélia Prado, e muito distante das correntes parnasianas.

Mostrando-os a um velho amigo, disse-me ele:

- É, para uma quiteriense, até que é razoável.

Não sei o que mais me desesperou, o “É”, o “para uma quiteriense”, ou o “até que é razoável”, embora de tudo, a expressão de desconsolo que o caro amigo, sórdido conhecedor de Alcides Pinto, fizera fosse tão mais assustador.

Tentei ser convincente, rasguei alguns elogios à poetisa quiteriense.

- “Aracy Martins soube plantar com amor e sutilidade espiritual, na terra agreste, a semelhança dos sublimes ideais que a fez destacar-se entre os melhores poetas do mundo literário quiteriense”.

Ele retrucou:

- Ah, mundo vasto mundo!

Descompus-me, enchi os pulmões, e gritei alguns versos da poetisa:

- “Hirto, caíste. Em vez de berço, agora

Da fria laje é que seu beijo aflora

Quem, triste e só, perdeu o bem que tinha”.

Ele me deu as costas.

Foi então que aprendi que não se faz alguém gostar de um poeta recitando seus malgrados versos. E tão menos quando se trata de poetas quiterienses, já que parece não sermos predestinados às letras, embora fossemos bons escritores, seríamos péssimos autores, como atestou aquele amigo:

- Escrever não é a mesma coisa de criar.

Deveras que não é.

Mostrei depois, cálidos versos dessa poetisa a uma amiga, leiga no que se refere à literatura ou as animosidades intersubjetivas.

- São lindos!

- Por quê?

- Porque são lindos!

Deveras que deveria ser, tal que ela nem lembrara tratar-se de uma poetisa quiteriense; e tão menos se referira aos versos com aquele ar de Alfredo Bosi.

Foi, então que vi naqueles versos de Bilac um punhado de verdade: Para ouvir estrelas, não é preciso entendê-las.

Nacélio Rodrigues Lima
Enviado por Nacélio Rodrigues Lima em 14/12/2011
Código do texto: T3389277
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