Entre o amor e a hipocrisia
Entre o amor e a hipocrisia
Como tudo nessa vida, o ano também está chegando ao final... E não sei sob que influência, ou fenômeno natural, os anos parecem que cada vez passam mais rápido. Ultimamente, quase não tenho visto o tempo passar. Mal janeiro começa, o carnaval vem chegando, depois vem semana santa, dia das mães e de repente, já chega junho com suas festas e as férias do meio do ano. Num suspiro só. Aliás, mal dá tempo de suspirar, porque agora é um tempo muito curto para as crianças e professores esquecerem-se da escola e levarem toda a euforia para dentro de casa, para desespero dos pais. No segundo semestre então é que a coisa voa. Nem bem agosto chega, e já vem semana da criança, dia do professor, feriados de uma semana e novembro que anuncia que o natal se aproxima, sem dar tempo nem para preparar a casa... Vivemos um ritmo louco, correndo pra lá e pra cá, na maratona exaustiva da sobrevivência. Quando temos uma pausa para olhar no espelho é que descobrimos cabelos brancos que chegaram de repente, rugas que a gente nem sabia que estavam ali e as olheiras, as eternas olheiras do cansaço que tomou conta da gente e nem percebemos, porque nos acostumamos com ele. Ficamos tão sobrecarregados com o expediente do ano que nem percebemos que envelhecemos, que deixamos a vida passar lá fora, bem diante de nosso nariz e não vivemos. Apenas corremos acudindo as intempéries, fiscalizando o relógio para não perdermos a hora, engolindo sapos no emprego para manter a fonte de nossa renda e digerindo os mesmos, alimentando uma depressão que só vamos descobrir mais tarde, quando o gosto pela vida começar a ficar amargo. Dedicamos tempo demais para as coisas e tempo de menos para o amor, a família e os amigos. Nos tornamos escravos da televisão, objetos da sociedade, vítimas da violência do mundo, que vai enchendo nossos corações de calos com as mazelas de todos os dias e pessoas sem opção diante da concorrência suja da escala social. Então de repente, chega o natal... os homens se enchem de amor e hipocrisia. Os dois juntos, assim mesmo, sem discussão. Porque no coração dos homens, cabem as duas coisas. O amor de verdade por aqueles que preenchem ou fazem falta nas suas vidas e o amor que apenas fingem, numa convenção que alguém inventou de que natal é tempo de amor, tempo de paz, tempo de doação. Então, abraços são trocados em nome desse amor que só dura uma noite, a paz é festejada, a doação acontece, nem que seja numa cesta básica ou em presentes para crianças pobres. O jargão de fazer alguém feliz nem que seja por um dia apenas tem lá o seu mérito, ver brotar um sorriso pode trazer paz ä consciência, pagar tributos pela indiferença existente no resto dos outros dias do ano. Cada um escolhe o seu jeito de viver, não cabe a ninguém sair por aí medindo ou julgando o amor dos outros. Ser feliz assim, por um dia apenas , é opção de quem só oferece as mãos nesse dia e depois se tranca na indiferença nos outros. Então é natal... dia de fazer de conta que a felicidade ainda existe para muitos. É só uma questão de escolha: entre o amor de verdade sempre presente nos seus dias ou uma noite intensa, vivida na mais brilhante hipocrisia.