NATAL: O ROSTO RISONHO DE DEUS

Compilado por Ramires Karamazov1

“No pequeno tamanho das crianças louvaste o símbolo da humildade, quando disseste: delas é o Reino dos Céus”.

(Santo Agostinho)

A verdade mais fundamental do Cristianismo, a de que Deus assumiu a nossa carne, não é levada a sério pela maioria dos cristãos. Deus se fez corpo. Encarnou-se. Quem nos diz isso são os textos sagrados que afirmam: “E o Verbo se fez carne”. O corpo é a imagem de Deus. Nosso corpo revela o desejo de Deus. Afinal de contas, o que nos segreda a doutrina da encarnação é que Deus, eternamente, quis ter um corpo como o nosso.

Estamos habituados a pensar que encontraremos Deus onde o corpo termina: e o fazemos sofrer e o transformamos em besta de carga, cumpridor de ordens, em máquina de trabalho, em inimigo a ser silenciado, e assim, o perseguimos, ao ponto do elogio da morte como caminho para Deus, como se Deus preferisse o cheiro dos sepulcros às delicias do Paraíso.

A razão? É que queremos ser mais espirituais que o próprio Deus. Onde ele nos fala da vida, do corpo, do mundo, preferíamos que ele nos tivesse falado do segredo do além-túmulo... A humanidade de Deus nos incomoda! Isto mesmo: a humanidade de Deus. Corrijo-me. Não é que os cristãos, depois de solidamente cristãos tivessem descoberto a humanidade de Deus como algo a mais sobre o que falar, algo que se podia acrescentar às ideias teológicas. A verdade é inverso. Foi quando eles entenderam que para falar de Deus é necessário deixar de falar de Deus, e falar sobre um homem, um rosto, uma vida... Foi então que eles ficaram cristãos.

Deus, para falar de si, tornou-se homem. Falar sobre Deus é falar sobre o homem! Nasceu, viveu, morreu... O corpo não está destinado a elevar-se a espírito. É o espírito que escolhe fazer-se visível, no corpo. Rubem Alves, profeta-poeta, diz que “a alma começa quando o corpo termina. Deus cansado de ser espírito, descobriu que o bom mesmo era ter corpo, e até se encarnou, segundo o testemunho do apóstolo. Preferiu nascer como corpo, a despeito de todos os riscos, inclusive o de morrer. Porque as alegrias compensavam. E nasceu, declarando que o corpo está eternamente destinado a uma dignidade divina. Curioso que os homens prefiram os céus quando Deus prefere a Terra”.

O natal rejuvenesce a essência da sabedoria bíblica: seremos salvos quando nos tornarmos crianças. O místico Jacob Boehme sabia disso e disse que a única coisa que Deus faz é brincar. Os homens perderam o Paraíso quando deixaram de ser crianças brincantes e se tornaram adultos trabalhantes.

A criança é o símbolo da inocência, é o estado anterior ao pecado, infância é o retorno a simplicidade natural, de espontaneidade. A criança é espontânea, concentrada, sem intenção ou pensamentos dissimulados. Ela é a totalidade da alma. É a parte genuína que perdemos quando adultos. Acho que foi por isso que Jesus de Nazaré, diante dos homens velhos e carrancudos proclamou uma verdade que abalaria todo o processo de maturação: Deixai vir a mim as criancinhas, por que delas são todas as bolinhas de gude do Reino dos Céus” (ou quase isso!).

Assim, o resgate da criança interior é a esperança para aquilo que todos nós ansiamos. Enquanto ela não for realmente vivida, enquanto não se tornar uma realidade para nós, será sempre uma criança abandonada. A cura e o resgate desta criança é a tarefa de cada um de nós. É precisamente no corpo que Deus e o humano se encontram!

Feliz natal, e que o Deus-menino possa lhe conceder

as mais alegres e divertida bênçãos em 2012.