À BEIRA DA MORTE!

À beira da morte!

(Theo Padilha)

O melhor emprego que tive foi quando trabalhava na revenda da Brahma de Joaquim Távora. Eu era um cidadão livre. Não era escravo e nem era senhor. Trabalhava muito com os mapas da Cia. Cervejaria Brahma, numa época que a revenda ainda não possuía computadores. Ali trabalhei cerca de 10 anos. Era comum fazer viagens para a Cia. Brahma em Curitiba.

Certa vez no ano de 1981, mais ou menos, tive que ir até Curitiba para uma reunião. Era o final do ano, logo depois do Natal. Fui com o caminhão do Seu Chiquinho. Velho amigão, desses que cuidam muito bem do caminhão. Para entrar no seu Mercedes era preciso limpar os pés. Tinha a mania de limpeza.

A Brahma de Curitiba era uma beleza. Eu adorava fazer cursos naquela companhia. Além de um ótimo restaurante, era servido chope na hora do almoço a vontade. Às sextas-feiras, “caipirinha”. E eu quase não gostava disso...

Diverti-me muito na capital do Paraná. Fiz novas amizades. Fui ao cinema depois do curso. Tomei muito vinho. Muita cerveja. Fui às lojas. Minha filha Julie, já tinha sete anos. E estava nas aulas de balé. Era a baliza da fanfarra de sua escola. E havia me pedido, encarecidamente, uma sapatilha para balé. Não me esqueci. Comprei a sapatilha e outras coisas para ela.

A viagem de volta estava marcada para o dia 28 de dezembro de 1981. Eu deveria voltar com o Mário Correia, no seu Mercedes Benz, caminhão Truck, como era chamado, que fora buscar cerveja. Combinada a carona que deveria sair de Curitiba logo depois do almoço, aproveitei para tomar as “saideiras”. O caminhão do Mário havia acabado de carregar às 12 horas. Quando fui para o caminhão notei que havia três na cabine. Nosso patrão era meio bravo e fiquei com medo de viajarmos em quatro indivíduos. Além do Mário, estavam juntos, um filho de motorista da Brahma, o Ari Goes e um moreninho que trabalhava na Tarfil de Joaquim Távora, o Aparecido. Pensei comigo: Seja o que Deus quiser. Vamos lá. O motorista nada bebia, mas nós três fizemos várias paradas para tomar e comprar cerveja. E fomos cantando pela estrada muito felizes.

Quando nos aproximávamos do município de Castro, todos cantando a música “Galopeira”, e ao entrar “naquela curva”, o caminhão que andava depressa deu um estalo, e começou a ziguezaguear. Alguma coisa havia quebrado de suas ferragens. Eram os patins do freio. Já era tarde. Umas 17 horas. Agora todos pararam de cantar, o suor corria na testa do Mário, na ânsia de controlar o “bruto”. Eu estava à janela. Notei que as guias iam se amontoando sob as rodas dianteiras. O caminhão não obedecia aos freios. Quando vi aquela mata espessa bem à minha frente, pensei que fosse um barranco, onde bateríamos. Fechei os olhos. Mas não era. Pelo contrário, a mata escondia um precipício. Mas o motorista conseguira dominar o caminhão. Ou as guias segurá-lo. Paramos. Eu disse:

− Vou abrir a porta e descer!

− Cuidado! Não desça ainda, não abra a porta, podemos cair! – gritou Mário.

O caminhão carregado com 350 engradados de cervejas balançava no precipício. Parecia uma gangorra. Abri a porta, contrariando o apelo de Mário, e tentei me abaixar entre a carroceria e o barranco abaixo. Achava no meu etílico pensamento, que ao tombar o caminhão me daria espaço para sair livre sob suas ferragens. Que ele me daria um “chapeu”, como no futebol. Analisando depois, cheguei à conclusão de que a terra fofa sob o peso do caminhão me arrastaria junto com tudo. Seria certamente esmagado! Talvez o único a morrer.

Até que enfim consegui sair daquela grota, incólume, o veículo não tombou, não deu o chapéu. Saí correndo com as sapatilhas de minha filha nas mãos, que agora estavam juntas, agradecendo a Deus, e me prostrei de joelhos no meio do asfalto, dando graças a Deus por estarmos todos vivos. Nunca esqueci esse episódio.

Depois que pedimos para alguém avisar nosso patrão, ficamos aguardando, o socorro que veio logo depois. O Ismael, motorista do caminhão que tinha vindo repassar a carga, era primo do Mário.

− O seu Waldemar, pediu para você me dar o caminhão, primo! – disse Ismael para o rapaz. Esse ficou quase maluco de raiva.

Passada a perigosa carga com sucesso. Pois todos temiam com a retirada de alguns engradados o caminhão despencaria precipício abaixo. Fomos jantar num restaurante logo na frente. Ali o Mário ainda fulo, xingava o primo e arremessava a carteira de trabalho no chão, gritando:

− Eu, sou gaúcho de quatro estados!

Essa até hoje não entendi. Graças a Deus nada de mal nos aconteceu...

Joaquim Távora, 10 de dezembro de 2011. All rights by Theo Padilha©

Theo Padilha
Enviado por Theo Padilha em 09/12/2011
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