CIÚMES DO IRMÃO
Gosto de sair com meu irmão. Não com a mesma frequência de quando eu era solteiro, mas, vez em quando saímos, e são sempre divertidos nossos papos e passeios. A diferença de idade nunca impossibilitou nossa comunicação descontraída. Sinto-me como se tivesse também vinte e quatro anos, e me despojo de todas as formalidades do dia-a-dia, dando boas risadas com as gírias e tiradas espirituosas dele.
Algum tempo eu o recriminava ao ouvir aquele inaceitável “maior bom”, mas o João respondia-me descredenciando-me totalmente, assim: - “Relaxa, fica de boa aí”. Então, resolvi entrar na dele nessas andanças ou mesmo em casa. Eu me toquei que ainda sou jovem e preciso me policiar pra não me revestir antecipadamente da toga, ou melhor, da farda de alferes com a qual se despersonalizou Jacobina, personagem do conto O Espelho, de Machado de Assis. Deixo de lado o rigor formal poético, a linguagem técnico-jurídica e saboreio o doce coloquial com o mesmo prazer de um sorvete ou o nº 9 do Burger King. Isto me faz um bem incrível, especialmente depois que sou pai. Preparo-me para em breve conversar com meu filho, garoto de uma geração pós ifone, pós iped. Tomara que eu não seja demasiadamente protetor, tampouco ciumento, como ainda sou para com o meu irmão. Descobri ontem que ainda tenho ciúmes dele, sim.
João foi ao meu trabalho. Uma alegria recebê-lo ali. Nada melhor à burocracia formal do que uma súbita e descontraída evidência. Alguns que já o conheciam fizeram festa; outros a quem o apresentei ficaram com ótima impressão. Uma figura feminina bem mais que as outras, pelo que demonstrou. Percebi nela, bem mais velha que ele, um entusiasmo mais acentuado, mas nada, em princípio, pareceu-me anormal. Mais tarde, porém, vieram as perguntas. Insinuações, hipóteses de um eventual encontro e tudo mais. Depois pediu-me o número do celular do garoto. Achei um pouco demais. Disfarcei. – Não estou autorizado, peça a ele. Justifiquei. Inútil. A insistência ultrapassou. Incomodado, usei da franqueza: - Meu irmão é comprometido, é noivo. A pretendente sorriu com naturalidade. Quase a dizer-lhe umas boas, calei-me, sério. Achei-me quadrado, meio careta, qualquer coisa desse gênero. Mas ao mesmo tempo orgulhoso de mim mesmo, da minha formação, do carinho que tenho pelo meu irmão mais novo, por esse cuidado que sempre tive com ele e que eu percebo que ainda existe. Eu nem sei se isto é bom ou certo. Você que me ler, dirá isso. Até o João haverá de dizer alguma coisa. Digam lá ele e todos: - Isto é ciúme. Que seja. Mas não digam que eu seja possessivo, embora eu afirme: meu irmão não é para qualquer uma.
Gosto de sair com meu irmão. Não com a mesma frequência de quando eu era solteiro, mas, vez em quando saímos, e são sempre divertidos nossos papos e passeios. A diferença de idade nunca impossibilitou nossa comunicação descontraída. Sinto-me como se tivesse também vinte e quatro anos, e me despojo de todas as formalidades do dia-a-dia, dando boas risadas com as gírias e tiradas espirituosas dele.
Algum tempo eu o recriminava ao ouvir aquele inaceitável “maior bom”, mas o João respondia-me descredenciando-me totalmente, assim: - “Relaxa, fica de boa aí”. Então, resolvi entrar na dele nessas andanças ou mesmo em casa. Eu me toquei que ainda sou jovem e preciso me policiar pra não me revestir antecipadamente da toga, ou melhor, da farda de alferes com a qual se despersonalizou Jacobina, personagem do conto O Espelho, de Machado de Assis. Deixo de lado o rigor formal poético, a linguagem técnico-jurídica e saboreio o doce coloquial com o mesmo prazer de um sorvete ou o nº 9 do Burger King. Isto me faz um bem incrível, especialmente depois que sou pai. Preparo-me para em breve conversar com meu filho, garoto de uma geração pós ifone, pós iped. Tomara que eu não seja demasiadamente protetor, tampouco ciumento, como ainda sou para com o meu irmão. Descobri ontem que ainda tenho ciúmes dele, sim.
João foi ao meu trabalho. Uma alegria recebê-lo ali. Nada melhor à burocracia formal do que uma súbita e descontraída evidência. Alguns que já o conheciam fizeram festa; outros a quem o apresentei ficaram com ótima impressão. Uma figura feminina bem mais que as outras, pelo que demonstrou. Percebi nela, bem mais velha que ele, um entusiasmo mais acentuado, mas nada, em princípio, pareceu-me anormal. Mais tarde, porém, vieram as perguntas. Insinuações, hipóteses de um eventual encontro e tudo mais. Depois pediu-me o número do celular do garoto. Achei um pouco demais. Disfarcei. – Não estou autorizado, peça a ele. Justifiquei. Inútil. A insistência ultrapassou. Incomodado, usei da franqueza: - Meu irmão é comprometido, é noivo. A pretendente sorriu com naturalidade. Quase a dizer-lhe umas boas, calei-me, sério. Achei-me quadrado, meio careta, qualquer coisa desse gênero. Mas ao mesmo tempo orgulhoso de mim mesmo, da minha formação, do carinho que tenho pelo meu irmão mais novo, por esse cuidado que sempre tive com ele e que eu percebo que ainda existe. Eu nem sei se isto é bom ou certo. Você que me ler, dirá isso. Até o João haverá de dizer alguma coisa. Digam lá ele e todos: - Isto é ciúme. Que seja. Mas não digam que eu seja possessivo, embora eu afirme: meu irmão não é para qualquer uma.