JANELAS DA ALMA

Tem certas coisas que nos deixam pra baixo, como por exemplo o olhar de uma pessoa que sofre, que está passando por algum problema sério, de saúde, financeiro ou um outro problema qualquer. Problema é problema e quando é de difícil solução, dói muito e faz sofrer. Tem gente que não liga não, são do tipo daquelas pessoas que pensam "se não me atinge, nem ligo...".

Hoje é domingo, e a maioria das pessoas está com seus familiares, com seus filhos, com sua amada, batendo um papo com algum amigo, esperando o futebol na TV ou aquele filmezinho que vai passar e que a gente prepara a pipoca e assiste juntos. É, mas o mundo não é só isso não, tem o outro lado também, e a gente nem lembra que nesse nosso mundo perfeitinho tem gente que não tem onde dormir, o que comer, que sofre, que tem que pedir e passa por humilhações por isso, porque nem todos acreditam, porque não olham em seus olhos e não enxergam a verdade do que dizem, não veem que a alma sofre porque a única solução naquele momento é pedir ajuda.

Hoje de manhã, eu e minha esposa estávamos lá na praça e ela estava dentro da padaria sendo atendida quando fui abordado por uma mulher de uns 26 anos mais ou menos, que me pediu que lhe comprasse uma lata de leite em pó, no super-mercado o preço está por volta dos R$ 8,50, e aqui na padaria chegou perto dos Dez Reais. Quando ela se aproximou percebi que já não tomava banho há algum tempo, as suas unhas estavam sujas, mas as roupas aparentemente limpas, não havia nenhum hálito alcoólico e se expressava bem, isso tudo porque a nossa primeira reação é desconfiar, não sei bem de que, afinal o que ela faria com uma lata de leite em pó se estivesse mentindo? Foi então que olhei para os seus olhos...as janelas da alma... e eles me disseram tudo o que eu queria saber, me mostraram seu sofrimento, sua humilhação, toda sua verdade, os sinais de sua história estavam presentes ali, ela nem precisava contar...tristeza...abandono...solidão... Olhei ao redor e percebi que ninguém prestava a atenção, ela simplesmente era invisível, seu sofrimento era invisível a todos. Eu lhe entreguei o leite em pó, ela agradeceu, disse-me "é difícil encontrar quem ajude, ainda mais quando o pedido custa Dez Reais. Muito obrigada, fique com Deus" e seguiu seu caminho, levando consigo uma pequena sacola com um pouco de arroz cru e agora a lata de leite em pó.

Aquela mulher se foi, e conosco ficou a decepção de nossa incapacidade de poder ajudar mais, a certeza de que o pouco que fizermos foi pouco, muito menos do que ela realmente necessitava, carinho, afeto, aconchego, família, amor fraterno, sentimentos que perdemos em nossa caminhada egoísta rumo a conquista de nossos desejos. E esquecemos que "compartilhar é preciso".

"Mas quando derdes esmolas, que não saiba a vossa mão esquerda o que faz a direita. Para que a esmola fique escondida, e vosso Pai que vê o que o que vós fazeis em secreto, vos pagará" (MATEUS)

Paulo Regent

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