PEÇO SEGREDO AOS COLEGAS DO RECANTO DAS LETRAS

PEÇO SEGREDO AOS AMIGOS DO RECANTO DAS LETRAS.

danilos

Estou para tomar uma decisão e na avaliação dos prós e contras fui no fundo do baú buscar essas lembranças. Há muitos e muitos anos, minha mulher ganhou uma boneca de colocar em cima da cama para adorno. Era uma boneca bonita, com um sorriso meigo e braços abertos como se desejasse abraçar quem perto chegasse. Seu vestido era rodado e decorava muito bem o quarto (para quem gosta). Casados há pouco tempo, tudo eram flores, mas quando eu ia dormir tinha que tirar a boneca por em um canto para depois encontrá-la de novo em cima da cama no dia seguinte. A mulher gostava eu respeitava, mas tudo tem um limite, o negocio começou a aborrecer. Mudamos, casa nova, vizinhos novos, moveis novos mas a belezura em cima de minha cama. Conversamos a respeito mas ela dizia que o quarto ficava mais bonito e eu rebatia dizendo que nosso quarto não era para visitação pública, mas não tinha jeito as duas se uniram contra mim e me venceram. Só que depois de um tempo o sorriso da boneca me parecia irônico, tinha a nítida impressão que ela zombava de minha falta de domínio no meu próprio quarto. Deixamos São Paulo, mudamos para o interior, vida nova, um mundo novo, outro ar, outro clima, outro povo, mas não demorou a bichinha se aboletou de novo em cima da cama. Depois de um tempo isso começou a ser motivo de discórdia e para acalmar os ânimos a danadinha foi ocupar um lugar em cima do guarda roupa. E lá de cima ela fazia a mesma carinha de merda e tirava um barato de minha cara. Em uma inesquecível e prazeirosa tarde fiz uma fogueira para queimar restos de uma arvore que caíra há longo tempo e aproveitei para jogar no fogo mais alguns trastes. Cansado me aproximei da janela do quarto e olhei para a boneca, idéias estranhas me passaram pela mente e não deu outra joguei ela na fogueira. Assisti seu desaparecimento. Sem cadáver não há crime, foi realmente o crime perfeito, a qualquer pergunta eu responderia não ter conhecimento sobre o paradeiro. Me preparei para a batalha mas para minha surpresa ela jamais deu por falta da boneca, nunca mais lembrou-se ou perguntou por ela. Hoje poderia até contar-lhe pois o crime prescreveu, já passaram mais de vinte anos, mas prefiro deixar as coisas quietas e peço segredo aos colegas do Recanto das Letras que tenho como um ombro amigo para desabafar esses assuntos. Tudo isso me veio à lembrança porque agora tem um vaso de vidro com bolinhas de gel dentro e ornado com flores artificiais que fica em cima da mesa de centro na sala. Eta vazinho inútil e sem graça e que incomoda pra caramba. Alem de feio fica entre o sofá e a televisão, às vezes impedindo a visão quando se deita no sofá ou então inibe o controle remoto, obrigando a se levantar o aparelho para que funcione. Mas coitado de quem for contra, é guerra na certa. Então estou pensando cá comigo e acho que é o momento de fazer um trabalhinho diplomático.

danilos
Enviado por danilos em 07/12/2011
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