A PROSTITUTA (Aleixenko Oitavo)
A PROSTITUTA
Estamos nos idos dos anos 30. Cidade de Gorobixaba. Rua Doce quase esquina com a Barata Cascuda. Ali, ainda hoje existe um imenso casarão explorado pelo LULO como armazém e pensão. Barões do leite, latifundiários importantes, personalidades da política local, a sociedade promíscua e os pés inchados de todos botequinhos, freqüentavam a Casa da Luz Vermelha, como era conhecido o cabaré e armazém, do LULO. Anônimos e uma mescla sem fim de notoriedades freqüentavam o local diariamente, mas à noite fervilhava de homens. Mulheres só as rameiras da própria casa. O principal chamariz era o cheiro que vinha da cozinha. O vaivém incessante já era atraído desde a passagem na calçada, pelo cheiro do tempero de pequi com frango, com macarrão; e, o ranço de gordura impregnada do bife acebolado ou o aroma do café especial e dos pães de queijo feitos ali mesmo. Tudo isto chamava para dentro a freguesia indecisa que, uma vez lá dentro era induzida aos prazeres da carne e do sexo. Quando satisfeitos retornava sempre e o negócio ia crescendo.
A casa da luz vermelha precisou ser ampliada, pois, além dos usuários por hora, agora já hospedava, os freqüentadores de outros municípios; e, alguns desavergonhados gorobixabenses. A fachada continuou intacta, paredes de adobes sem reboco; e, aquela horrível lâmpada vermelha pendurada sobre a porta do meio, alumiando letras desbotadas que não dava margem á dúvida: ARMAZÉM E CABARÉ SANTA MARIA DO LIVRAMENTO.
As outras quatro portas, como a do meio eram de madeira, divididas em duas partes, que abriam para os lados, cada uma independente da outra.
Lá dentro era um emaranhado de caixotes de madeira e caixas de papelão; espalhados pelo interior de um cômodo único, de dimensões 13 X 32 metros. Com prateleiras, também de madeira, encostadas às paredes, menos uma que cortava o recinto na largura, em um terço do comprimento, fazendo a vez de tapume, deixando um vão de acesso ás camas usadas na arte do meretrício.
Logo na entrada do cômodo vinham as mercadorias, algumas expostas como guarirobas in natura, arrancadas pelas raízes, cachos de bananas, bandas de leitoas mortas dependuradas para defumar, réstias de alho, rolos de arames farpados, bolas de salames; e dentro das caixas e caixotes tinha milho seco em espigas, arroz em casca, feijão na munha, sal grosso e muitos outros artigos úteis aos moradores da zona rural; e, da própria zona vermelha, como pomadas para lubrificação de ânus, antibióticos contra doenças venéreas, pílulas abortivas e anticoncepcionais; além de outras variedades em perfumes, sabonetes, cremes faciais e de tudo para embelezamento. E lógico, bebidas alcoólicas comuns como cachaça, cerveja; e, exóticas como champagne e wiski.
Na reforma construiu-se outro andar, tipo cobertura, em toda a extensão do galpão. Criou-se um lance de escada com degraus em pedra bruta, para chegar-se aos quartos, agora dormitórios e/ou transitórios, em número de sete cubículos. Nunca antes e nem agora teve banheiro, nem se quer um mictório. Com a reforma foi construída, nos fundos, uma “casinha”, conhecida como privada.
Também foi instalada uma linha telefônica, única, logo no começo do patamar da escada.
Enfim era o diabo na casa do terço!
Mas vamos aos finalmente.
Perdoem-me o início drástico, mas esta história é uma constatação arbitrária, porém realista. Doidivânia, de menina inocente, chegou a prostituta por opção; nunca aceitou as críticas da sociedade, sociedade esta que nunca quis conhecer as razões que a conduziram a esta alternativa de vida, simplesmente execravam-na. Conceitos pessoais à parte, “ELA” tinha o seu mundo; e, era, ou parecia ser feliz dentro dele. Distanciada dos que viviam fora do seu mundo particular, e, só faziam, segundo ela, seguir a moda dos preconceitos e taxar de imoral sua conduta, inadequada a certos princípios desta mesma sociedade.
Fez da prostituição um negócio, e ganhou tanto dinheiro que desbancou uma casta de falsos ricos; chegou mesmo a emprestar altos valores a estes. Reuniu as vantagens do poder que dá o dinheiro ao poder magnético de sua beleza física e inteligência para conquistar o mundo e conseguiu, mas à sua maneira.
No meio desta rotina, às vezes monótona, outra atribulada assim foi vivendo até completar dez vezes sete anos. Sua prosperidade, mais tarde foi considerada mágica, não sabiam eles das estratégias que “ELA” usou para conquistar clientes, alguns até apocalípticos. Sua clientela, que já fora requintada e escolhida a dedo, agora era a escória do submundo noturno de Gorobixaba.
Mas também já fora linda! Vestida com esmero, em manequins exclusivos, desde as sandálias até os brincos de pedras preciosas. Até a voz era sensual, num sotaque meio sulista. Já fora desejada só por ter o umbigo à mostra; hoje é vista como uma megera, ainda que simpática; cortês e galanteadora.
Por trás das cortinas foi uma sereia, hoje de frente para o palco da vida é uma mula sem cabeça.
Os homens, que já foram sua fonte de renda e prazer; hoje te dão nojo e prejuízo.
Por isso “ELA” morre de inanição.
(março/2010)
Por ALEIXENKO OITAVO, Primeiro Ministro do Reino de Gorobixaba