A estrela

     Nas noites que precedem o Natal visito, com mais frequência, o céu noturno. Coisa de gente abestada ou, no mínimo, de quem não tem o que fazer. Em qual das duas hipóteses serei enquadrado, não sei. Diga-o, o leitor.
     Mas é verdade. Chega dezembro, e, vez em quando, me surpreendo na varanda do meu apartamento olhando para o céu da Pituba, o mais belo céu de Salvador. Isso até altas horas!
     Faço-o, e eis o motivo: querendo descobrir uma estrela que lembre a de Belém, a estrela mais falada e reverenciada nos dezembros de todos os tempos. 
      Nos compêndios, desde os mais simples aos mais sabidos, ela é descrita como uma estrela de fulgor diferenciado, deslumbrante, e maior do que as suas irmãs. Um destaque no pio céu natalino.
     Imagino-a mais brilhante do que a estrela dalva, o Planeta Vênus, se assim o caro amigo desejar chamá-la.
     Quero dizer que, para mim, o nome pouco importa: estrela dalva, estela do pastor, estrela matutina, estrela vespertina, ou simplesmente Vênus. Ela é sempre linda!
     Porque sou um amante dos crepúsculos, chamo-a, carinhosamente, de estrela vespertina, sempre que a encontro ao cair da tarde.
     Mas a estrela de Belém, vejam como Coelho Neto (1864-1934) a descreve, no seu livro Mistério do Natal, de uma doçura sem limites:
     "Era uma estrela enorme, de brilho coruscante, que parecia haver atravessado a teia da Via Láctea, tendo dela trazido um rútilo farrapo que a seguia através do espaço."
     E mais adiante: "O astro subia em marcha grave e as demais estrelas esmoreciam à sua passagem, como se se retraíssem tímidas."
     E concluindo: "E quando a noite negrejou fechada, o astro, com a flamejante cauda aberta, parou no céu, sobre a caverna, como uma palma de luz que assinalasse o berço do Messias."
       Por tudo isso, ela continua sendo um dos símbolos mais simpáticos e respeitados do Natal. E não é uma invenção d´agora. A estrela de Belém é tão antiga quanto o Novo Testamento.
     No Evangelho de Mateus, o primeiro dos Evangelhos, escrito por volta de 80 d.C., ela aparece no Capítulo 2 e seus Versículos, na voz dos Reis magos: "Onde está o rei dos judeus que acaba de nascer? Vimos o seu astro no oriente e viemos prestar-lhe homenagem."
      Ela chama a atenção porque decora melhor a árvore natalina, tornando-a mais cintilante e mais viva.
     É exuberante enfeitando a fachada de predios residenciais e comerciais, no mundo todo. Quem foi a Nova York, no Natal, sabe bem disso.
     No topo de dois arranha-céus, que deixam meu prédio no chulé, vejo duas estrelas piscando. Tão belas, tão perfeitas, que parecem caídas, há pouco, do céu.
     Minha árvore de Natal - que hoje é mais dos netos, Catarina, Bernardo, Davi e Vitor -,  de cima a baixo, é decorada com estrelinhas irrequietas, cantando sem parar: Jingle Bells! Jingle Bells!.
     Não sei, mas me parece que essas estrelas dão maior realce aos presentes que já se acumulam, escondendo as "raízes" do pinheiro artificial, do tamanho de um bonde, "plantado" aqui na minha sala.
     Agora, se dependesse de mim, substituiria esse pinheiro por um frondoso pé de caju, trazido do Ceará.  
     É difícil conceber um pinheiro, coberto de "neve", no Natal no nordeste.
      Contemplar estrelas! Conta Ansel Grün, que o filósofo russo das religiões Pavel Florenski escreveu, em seu testamento, para os seus filhos, o seguinte:
     "Há muito tempo em quis escrever isso para vocês: Contemplem as estrelas o mais frequentemente possível. 
     Se vocês sentirem o coração pesado, contemplem as estrelas, ou durante o dia, o céu azul.
     Se vocês estiverem tristes, se alguém os magoar, se vocês não conseguirem algo, se houver um turbilhão nas suas almas, saiam ao ar livre e fiquem sozinhos com o céu. Então suas almas ficarão tranquilas."
     Ficando a sós com as estrelas, ouvindo-as, como fazia Bilac, centemplando-as na noite escura, vejo que são válidos os conselhos do filósofo russo citado por Anselm Grün.  Diria, até, que todas elas são estrelas de Belém...

               



           
     



 

Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 06/12/2011
Reeditado em 18/10/2019
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