Gosto de sangue
Gosto de sangue
Recentemente, escrevi sobre a condenação de um inocente, que se destacou na mídia como o maior erro judiciário já ocorrido no Brasil. Não quero falar sobre isso de novo, porque fico com vontade de chorar e me revolto com esse paradoxo da justiça brasileira. Não quero ocupar meu coração com raiva de pessoas mesquinhas, insensíveis e desumanas, porque assim estarei me deixando dominar pelos sentimentos torpes que na certa, comandam o coração dessas pessoas. Mas algumas coisas não temos como ignorar. Essa semana, vi pela televisão (juro que estou querendo deixar de ver noticiários), a prisão de um serial killer, que há pouco tempo havia sido solto, após ter cumprido parte de sua pena. O ex-policial, segundo consta, havia participado do massacre do Carandiru e nunca foi julgado por isso. Continuou na polícia e só foi expulso ao se acusado de ter assassinado seis travestis. Foi preso e condenado a cinqüenta anos de prisão, da qual saiu recentemente, sem ter passado por qualquer exame para avaliar se o sujeito havia se recuperado. Foi colocado em regime aberto e mal se viu em liberdade, assassinou friamente outro travesti. Segundo a literatura médica, jamais houve um caso de serial killer que tenha se recuperado. E todo ser humano, que tenha compulsão por assassinatos e que tenha feito mais de duas vítimas com o mesmo perfil ou com as mesmas características, é considerado um serial killer e deveria ser retirado da sociedade para sempre, seja para o isolamento numa penitenciária ou num hospital psiquiátrico, onde deveria permanecer para preservar a sociedade de sua insanidade ou maldade extrema. Não foi o que aconteceu com o Cirineu das quantas e de onde, eu não sei. Só sei, que por uma brecha da lei, foi agraciado com a liberdade que não merecia e tirou a vida de mais um ser humano, movido pelo preconceito mórbido que despertava seu lado monstro. Igual às feras que só descobrem seu instinto após sentir o gosto de sangue, esse homem na certa sentiu prazer ao sujar as mãos com a carnificina do Carandiru, onde cento e onze prisioneiros foram covardemente assassinados. Escolheu os travestis para aplacar sua sede de sangue. E a justiça, a bela justiça brasileira, a mesma que privou um inocente da liberdade sem um julgamento, errou na aplicação da pena de um assassino frio, ao qual premiou com uma liberdade mais criminosa que o próprio, pois esta foi concedida com a leviandade daqueles que não pesam a conseqüência de se lavar as mãos, diante de impasses da justiça. Na balança em que se pesa a lei, não pode haver dois pesos e duas medidas. E a venda nos olhos dela é para o símbolo, e não para quem é responsável para que esta seja cumprida. Já é tempo de rever esse Código Penal e as brechas que de vez em quando nos fazem sentir vergonha de sermos brasileiros. Principalmente quando envolve polícia e políticos que se bandeiam para o outro lado.