Corrupção a “ala minuta”!
Nas viagens que faço conheço de tudo um pouco, coisas pitorescas, histórias de terror, de contos sobre visagens. No entanto, não são as fábulas que me surpreendem e sim as pessoas e suas particularidades, seus costumes e crenças, despertam minha atenção, com aspectos intrínsecos, que impreterivelmente revelam nos seus comportamentos, muito de sua personalidade. Ações habituais com intensidade tamanha que é impossível não ser percebida até mesmo pelo menos sensível dos espectadores.
Dia desses almocei uma bela ala minuta, numa “lancheria” como se diz aqui no sul, em uma cidade aqui perto no interior, após me deliciar, fui pagar a conta: - dezoito e cinquenta, disse a atendente. Entreguei-lhe o dinheiro e pedi um comprovante de despesa, para a minha surpresa a moça, com um cordial sorriso e um ar prestativo perguntou: - de que valor o senhor deseja o recibo? Estupefato com a naturalidade com que ela me atirou aquela indagação, respondi meio bobo, com a mesma simplicidade: - Ah! Sim, quero no valor da refeição mesmo. Então ela preencheu o papel, meio desajeitada.
Essa experiência me fez refletir sobre um aspecto imundo que estamos vivenciando na sociedade e que infelizmente está encardindo os costumes de muitos brasileiros, o laivo da corrupção. Mediante ao exemplo fato, que relatei acima, passo a indagar a respeito de quantos moldes de corrupção ativa e passiva encontramos no cotidiano, entre as pessoas comuns, trabalhadores “honestos”, pais e mães de família, “doutores”, médicos, advogados. Ou será que corrupção é somente aquela feita por políticos?
Etimologicamente a palavra corrupção significa deterioração, quebra de um estado funcional e organizado, ou seja, rompimento do comportamento que se espera do chamado homem médio, e manifesta-se por meio do suborno, intimidação, extorsão, ou abuso de poder, entre outros. Muito já foi debatido, soluções falidas foram apontadas de todos os lados, sim, pois é, fácil apontar, meter o dedo na cara dos outros e dizer poucas e boas. Entretanto onde começa a corrupção? Na Câmara, no Congresso, nos gabinetes? Ou no caixa do restaurante?
Se tivesse aceitado a proposta de adulterar o recibo da ala minuta (por mais saborosa que estivesse), isso não seria uma forma de corrupção? Oferecer um “extra” para o agente de transito, aliviar na multa, por que realmente você “nunca” mais vai parar em mão dupla na frente da escola do seu filho (apesar de buscá-lo todos os dias!), seria corrupção? Tá espera um pouco, são só vinte reais? E é para o café? Afinal de contas você não gosta de corrupção, não é?
Fatalmente é esse tipo de pensamento, de costume, que ocorre entre as pessoas “honestas” desse país. E a opinião pública grita a quatro ventos e lamenta sobre a corrupção dos políticos, de parlamentares envolvidos com “bicheiros”. Porém, pela manhã se aposta na cobra, vaca, porco, que apareceu no sonho da noite passada, afinal da sorte.
Todavia, esses políticos não são representantes do povo? Então devem reproduzir o que o povo quer, e realmente estão fazendo isso, nos representando, até mesmo na forma de corromper, é claro que em escalas maiores, afinal eles não são “bobos”, são lobos, ou melhor, leões, que daí dá para apostar no jogo.
Vejam bem, para os que ainda não entenderam, é necessário ressaltar que esse mal realmente se corta pela raiz, porém ela é profunda e possui muitas ramificações de modo, que serão necessárias muitas tesouras e muito esforço para poder eliminá-las ou ao menos impedir o seu crescimento desenfreado.
Contudo se nosso comportamento não é exemplar como podemos exigir o mesmo de alguém? Precisamos refletir sobre isso, do contrário estaremos enforcando bruxas pelos tornozelos. Carecemos de semear a boa fé em nossas relações, do adverso os frutos que colheremos dessa árvore não terão um sabor tão agradável e a digestão não será nada fácil.
Lucas Carini