Padilhas
" De vermelho e negro vestindo a noite o mistério trás De colar de cor de brinco dourado a promessa faz Se é preciso ir você pode ir peça o que quiser Mas, cuidado amigo ela é bonita Ela é mulher"
O perfume é forte, exagerado; a gargalhada ecoa, distoa; no cruzar de pernas, ela mostra e não mostra; o sorriso encanta e esconde. Há no olhar um saber que não se pode falar; no girar um fazer que não se revela; porém tudo que vem dela parece ensaiadamente orquestrado, ora para atrair, ora para espantar. Ela é a voz da rua, o vento que destranca o caminho, ela é doce canto e armadilha; acenda o cigarro e sirva a melhor bebida, chegou Maria Padilha!
- Sirva-me, macho! - ela ordena. No olhar um domínio e fascínio. - Eu não sou só Maria, sou Ana, sou Pomba, sou Gira. Sou a mulher sem nome, a prostituta, a esposa espancada, a estrupada, a mulher agredida, a imunda... É claro, sem perder o charme e a elegância.
Ela gargalha mais um pouco e fala alto sobre sedução e sexo; o povo se distrai, não reflete sobre o que foi revelado; eu quietinho, vou assistindo essa força feminina, pura luz fluída, resgatando mulheres perdidas nas trevas da dor e da solidão. Vejo lugares medonhos, onde anjos não entram e mestres não pisam; não por falta de tentativa, mas por causa das leis de sintonia e vibração, o contato não se fixa; vejo essa legião de Mulheres Bonitas girando aqui e girando acolá, abrindo suas asas vermelhas e cinzas, acolhendo, transferindo mulheres sofridas dos ambientes mais densos para os mais sutis. Vejo essa legião de Ciganas batendo suas castanholas de luz e expulsando os maus espíritos; vejo tudo isso, enquanto o povo canta:
" E nos cantos da rua
Zombando, zombando, zombando está
Ela é Moça Bonita
Girando, girando, girando lá
Oi girando lá oiê
Oi girando lá oiê
Oi girando lá oiê
Oi girando lá..."