IMPRESSÕES DE VIAGEM - "BUENA - DICHA"
Quando nos decidimos por Araxá, dentre tantas outras estâncias mineiras, para as pequenas e urgentes férias do meu marido, eu jamais poderia imaginar passeio mais divertido.
O Alberto estava realmente necessitado de um descanso, e após muita insistência, concordou em fazer uma pequena estação de águas.
Instalamo-nos em modesto hotel, confortável e aconchegante, e começamos a aproveitar as belezas do lugar, rodeado de muito verde, flores e passeios.
Nosso programa constava de banhos relaxantes pela manhã, voleibol que ele brincava de jogar com algumas mocinhas que o admiravam pelo gênio brincalhão e comunicativo, caminhadas em grupo, piscina e às vezes pescaria.Almoço tipicamente mineiro e após uma soneca reconfortante.
Eu não o acompanhava, preferia sentar-me na varanda com algum trabalho de mão ou um livro. Ele, sempre animado, ria-se de mim e dizia: “não me peça para sentar-me a seu lado mãos juntinhas, apreciando a beleza da tarde, como em nossa lua de mel... Não dá, querida, preciso cansar o corpo para descansar a cabeça...”
e lá se ia ele...
Certa tarde, calada e quietinha num canto na varanda, ouvi sem querer a conversa de duas senhoras que, sem nenhuma reserva, trocavam confidências. Vinham do Rio de Janeiro, cansadas da vida agitada, e preocupadas com a violência daquela cidade enlouquecida.
Eu acompanhava o desabafo da senhora de fisionomia triste e abatida que clamava contra a filha e seu noivo, que queria desistir do noivado, casamento já marcado, e lhe propunha apenas “ficar”, sem compromisso mais sério.
O que mais a fazia sofrer era a aceitação da filha àquela situação, ela e o noivo, felizes a passear em Salvador, enquanto a mãe sofria inconformada.
A outra, mais alegre e falante, estava encantada com a vida:
- Pois eu, minha filha, sozínha desde a viuvez, estou em início de romance com um advogado aposentado que me tem levado para jantar, dançar e sonho qual adolescente... Ainda não sei muito acerca dele, mas estou aproveitando e vivendo...
E falavam, e se queixavam até que outras pessoas se iam aproximando, quando me afastei.
Na tarde seguinte, apenas uma se postara no mesmo lugar. Estava triste, sozinha e, discretamente, procurei aproximar-me. Conversávamos e percebi como estava tensa. Tomei-lhe as mãos num gesto de carinho e aproximação, estavam frias, apesar da tarde de temperatura amena. Fingi acompanhar-lhe as linhas da mão e ela julgou que eu as lesse...
- Você lê as mãos? - perguntou-me interessada.
Sorri-lhe e deixei que ela assim pensasse.
Falou-me do problema da filha que, aliás, eu já escutara antes.
Comecei então a falar-lhe à meia voz sobre sua excessiva preocupação que não a deveria absorver tanto.
- Pense um pouco mais em você mesma e esqueça os problemas dos outros. Sei que sua filha única é sua razão de ser, mas já é uma moça com capacidade de decidir seu próprio destino. Sem que a gente perceba, os filhos crescem e precisam alçar vôo, buscar seu próprio caminho.
O mundo mudou e você precisa acompanhar as mudanças...
Busque viver um pouco, saia da rotina, conquiste novos amigos, pois as penas divididas multiplicam as alegrias. Ponha um colorido novo em sua vida, compre coisas novas para você, substituindo suas roupas sérias e tristes que ensombram sua alma. Entre nessa onda de tratamento de beleza daqui, de onde a gente sai revigorada e bonita com esses banhos de lama. Alce vôo você também, dê liberdade para que você possa sentir-se livre. Dê à sua filha todo afeto, carinho e liberdade, mas menos conselhos, que aos jovens só aborrecem e jamais serão seguidos... Os tempos mudaram, sim, mas quem sabe um dia, talvez, sua filha reveja seus próprios conceitos...
Despedimo-nos e fui ter com meu marido que voltava suado e alegre.Contei-lhe do meu sucesso como “Buena-Dicha” e ele recomendou-me cuidado ao ficar enganando àquela gente crédula.
-Não há perigo, só lhes incuto coisas boas na cabeça e elas acham que “acerto” tudo...
- Veja, por favor, se meu namoro vai dar certo... (Claro que vai! Procure conhecer melhor seu “advogado”, seja simples, amiga, confidente...)
- Será que meu novo emprego vai sair? (Se você foi brilhante no concurso, tenha fé e aguarde...)
- Farei carreira como atriz? ( Você tem postura e talento., estude mais e as portas do sucesso lhe devem ser abertas...)
Todas as vezes que me aproximava da varanda, as pessoas já me aguardavam esperançosas. E por mais que tentasse convencê-las de que só fazia as “leituras” de brincadeira, não o conseguia.E fui fazendo "leituras" até ao meu último dia de férias.
Meu marido voltou descansado e pronto para reiniciar com ânimo seu trabalho, mas quem mais se divertiu fui eu, incutindo somente boas idéias na cabeça daquela gente tão carente, experiências adquiridas por mim através de leituras, cursos e palestras sobre comportamento humano, assunto que sempre me fascinou.
O meu maior interesse, no entanto, sempre foi ufologia, mas felizmente, ninguém ficou sabendo, senão poderia aparecer alguém interessado em conhecer algum “etê” e aí eu ia me ver em apuros...
Fiquei feliz em ser apenas “BUENA DICHA”