TENHO SAUDADE


Quando chega essa época próxima ao natal, a saudade vai batendo mais forte.
As cenas da minha meninice, retornam como se fosse um filme, e as luzes nem precisam se apagar, para a película começar.
Agora pouco abrindo uma porta da cristaleira da sala de jantar, encontrei uma "biscoiteira", que meus pais ganharam de presente em seu casamento.
Ela está idosa, em janeiro próximo fará 62 anos de vida.
Está sem tampa, pois a mesma quebrou, mas continua bela e delicada, é toda branca, com desenhos em alto relevo.
Uma peça antiga, hoje não se usa mais, e nem se conhece, pelo nome de biscoiteira.

Foi só vê-la, que a sessão de cinema começou, uma fita velha e picotada foi ligada, dentro da máquina fantástica que é o cérebro, e me vi menina, correndo alegremente pela casa de meus avós, feliz pois finalmente, havia chegado dezembro.
Mês por mim mais que esperado, além do nascimento DELE, eu também, nasci nesse belo mês.

Lembro que o Sr. Felipe, um italiano, como quase todo mundo lá da vila, vinha logo no começo de dezembro, refazer a pintura da sala de jantar de minha vó, depois  de pintar as paredes de  branco, retocava os cachos de uvas, pintado artisticamente por ele, em anos idos, num barrado ao pé do teto.
Ah, como me lembro desses cachos de uvas, como eram lindos, destacavam-se da parede toda branquinha, ele pintava o barrado, que tinha uns 30 ou 40 centímetros de altura, nas cores verde e roxa, da cor da uva madura.
Eu, me sentava no chão e ficava a olhar, aquele homem que tinha nas mãos uma habilidade que me fascinava.

Depois, lá ia minha vó, recolher as cortinas das janelas e lavá-las no tanque, até ficarem brancas como leite, em seguida estendia todas ao sol. Me lembro que adorava ver as cortinas alvas, dançando ao sabor do vento e secando ao sol.
Enquanto minha avó, colocava-as de volta nas janelas, ia me contando: Sabe, Leninha, hoje as janelas estão contentes, pois, elas sentem vergonha de ficar sem roupa, ou com as roupas sujas.
Eu, cheia de imaginação como sempre fui, ficava pensando, como as vidraças, estariam alegres, vestidas de roupas limpas.

Lembranças que podem parecer tolas, aos olhos de quem não as viveu, mas que são tão preciosas para mim.
Tanto que, mesmo com o filme gasto, e picotado, eu teimo em acioná-lo em minha memória, e rever as cenas encantadas, de um tempo que não volta mais de fato.
Porém em minha essência ele permanece tatuado.

Fiquei alguns segundos tocando com meus dedos, a biscoiteira branca, sentindo cada relevo, e pensando nas inúmeras vezes, que as mãos pequenas e macias de minha mãe, tocou aquele objeto.
Em dado momento senti como se nossos dedos se juntassem, e se acariciassem, através das memórias que moram em mim, e tenho certeza em minha mãe também.
Esteja ela onde estiver, para o amor e saudade, não existe dimensão impossível de ser ultrapassada. 



(foto da autora)

Lenapena
Enviado por Lenapena em 30/11/2011
Reeditado em 30/11/2011
Código do texto: T3364654