Sorriso metálico

O ortodontista decretou que eu iria usar aparelho. Inopinadamente disse não. Como? Colocar aquelas pecinhas na boca, abster-se de algumas delícias comestíveis? É isso mesmo e não é só. A rotina diária acolhe necessariamente algumas alterações importantes, como um tempo maior dedicado à higienização bucal e a obediência vital para que o tratamento produza seus resultados esperados.

A modificação estética torna-se um ingrediente a mais nas conversas com os amigos, principalmente os que já passaram ou estão vivenciando a mesma situação.

Numa simples observação, não havia como não dar razão ao Doutor. A situação dos meus incisivos, caninos, pré-molares e molares estava de mal a pior. Parecia um time lutando contra o rebaixamento (prá série D). Uma equipe mambembe, com deformidades em todas as suas posições, os caninos das alas, os incisivos da dianteira e os demais lá na retaguarda, cada um com funções específicas na mastigação.

É um grupo que deveria apresentar um bom rendimento, dentro de seu campo de atuação e, evidente, nas suas funções estéticas e de auxílio à fonação, juntamente com a língua. Isso eu li naqueles dias em que juntava o maior número de informações que pudessem ajudar na decisão sobre a validade ou não de usar o tal aparelho.

Na verdade, relutei até o último round com unhas e dentes, como os meus, sem dúvida, os mais desalinhados que caminhão com o parafuso de centro quebrado.

O ortodontista não tinha qualquer dúvida. Afeito a essas coisas, era sabedor que não haveria um outro caminho que não esse, de se colocar aquelas pecinhas metalizadas, atualmente tão normais. Eram raridades nos meus tempos de mocidade.

Achava que tendo eu atravessado o cabo da boa esperança não precisaria dessas modernidades, mesmo sabendo que são inovações que vieram para todos, de qualquer idade ou outra convenção social qualquer. Para derrubar essa premissa o Profissional tinha a resposta na ponta da língua – “uma senhora com 15 anos a mais que você, usa”.

Prá resumir: resolvi tirar a prova dos nove, dando início ao processo com as tais radiografias e a investigação cuidadosa que pudessem mostrar o estado atual da arcada dentária. O resultado mostrou aquilo que se apregoava: o esquadrão dentário requeria cuidados especiais, uma recauchutagem.

Minha avó sempre dizia que é preciso ter muita calma com todas as coisas. Concordo. Dalai Lama escreveu que, aquele que possui dentro de si uma grande reserva de paciência e tolerância, tem um certo grau de tranqüilidade e calma em sua vida. Que tudo isso possa estar presente no meu sorriso – metálico.

Adamar Gomes (novembro 2011)