DIA DA CAÇA
A distância entre o prédio em que moro até a academia onde faço exercícios é exatamente um quilômetro que eu ando de segunda à sexta feita, indo e voltando e nesse trajeto tem muita coisa para ser vista.
Senhoras varrendo as frentes das casas; aposentados passeando com cachorros que deixam os montinhos de cocô por todo lado e os proprietários, numa demonstração de incivilidade, deixam os excrementos dos seus animais para todos; crianças fardadas sendo entregues nas portas das escolas; trabalhadores apressados; vendedores de gás de cozinha, e forrageando aleatoriamente, pombos domésticos (Columba livia), andorinhas (Delichon urbicum), pardais (Passer domesticus), um ou outro canário da terra (Sicalis flaveola) ou galo de campina (Paroaria dominicana) e uma família de jumentos (Equus asinus) aposentados compulsoriamente pelo advento da moto, que hoje só não faz zurrar.
Mas essa tranquilidade, esse bucolismo de bairro afastado do centro comercial estava hoje alterado.
Os pombos domésticos estavam em polvorosa, por estarem sendo observados de muito perto por um carcará (Caracara plancus) que em seus vôos circulares estava cada vez mais perto do pombal.
Numa das investidas o pombo alvo do ataque logrou escapar.
Mas o carcará não desistiu de garantir seu almoço e talvez dos filhotes.
Pousou sobre a antena de TV e, como bom caçador que é, ficou avaliando a melhor alternativa para concluir a caçada.
Os falconídeos têm por hábito emitir um pio longo que caracteriza sua intenção de caça.
Talvez para avisar aos outros predadores que ali é seu campo de ação e que intrusos não serão bem vindos.
Mas esse aviso também é conhecido por suas presas que, ou fogem ou se defendem.
É o caso dos bem-te-vis (Pitangus sulphuratus) que por terem seus ninhos, vez por outra, visitado pelo vizinho indesejado, se juntam em bando para expulsar o invasor.
O resultado dessa peleja aérea é sobejamente conhecido.
O bem-te-vi por ser de porte bem menor, tem a capacidade de executar manobras que o grandalhão carcará não consegue.
Hoje uma patrulha com cinco bem-te-vis aplicou uma tremenda surra no carcará que não teve alternativa senão abandonar seu posto de observação e trampolim de ataque.
Talvez amanhã ele volte, mas hoje, 23 de novembro de 2011, foi o dia da caça.