Roubaram as ovelhas
A manhã de domingo, dias dos pais, o sol ardia. No largo do cemitério um encontro de saudade. No cruzeiro velho, velas crepitavam como lenha verde ao fogo. O sentimento das pessoas fazia vibrar o silencio e a respiração da terra ressecada pelo vento de agosto. Era exatamente um desgosto estar ali.
No calor da manha caminhava, olhando os mesmo túmulos que sempre costumava visitar nesse dia, as mesmas fotos, a mesma lapide, sem nenhuma ornamentação. Todos se foram. Não ficou ninguém para visita-los! Ou ficou, mas não se importam mais com o que ficou ali.
Andei por todo o cemitério, como uma brasa ao sol, esse local é muito quente, parece que é construído sobre chamas ardentes, lá uma coruja virando a cabeça bem em cima de um túmulo abandonado, deu um aspecto macabro. Passei por ela, parece que viu, mas não me deu nenhuma importância. Segui meus passos e ela ficou lá somente me acompanhando com o aqueles olhos perdido no nada.
Sem medo, depois de muito tempo estava no meio da selva de pedras, petrificadas, encontrei um pai e uma mãe, chorando a morte de seu filho, faz tanto tempo que ele se foi, mas a dor da ausência não vai embora. Sai dali quase chorando, com receio de que alguém me vice assim.
Adiantando-se encolhidamente, vi um gatinho lindo que dormitava à sombra de um velho tumulo e de repente um ninhada apareceu de trás do outro tumulo. Percebi que havia uma quantidade grande de felinos por ali. Um mais bonito que o outro. Senti uma vontade de acaricia-los com as mãos. Mas senti algo estranho, esses gatos dormem dentro dos túmulos em contatos com coisas putrefando. Como pode ser tão lindos assim? Será que são cuidados por alguma alma do além! Eles passam dias e noites por ali em companhia do chiado da coruja e do vento que geme nas arvores. Acabei me distraindo olhando os gatos e não me dei conta das horas, mas ainda faltavam muitos parentes e amigos para visitar. Pois queria fazer a visita completa, porque não gosto muito de vir a esse lugar. Engaçado, que antes eu gostava muito de passear por ali e ver a pessoas que chegavam recentemente. Deve ser porque sentia que ainda estava muito longe de morar ali. E hoje o tempo sem aproxima...
Levantou-se então, um cão que dormia ao pé de outro tumulo. Encarou-me compadecido, com seus lindos olhos arrasado d’agua. Ai que percebi que cima haviam depositado flores recentemente também um cimento mole a frente. Conclui que havia sido enterrado por esses dias. E o cão chorava a perda do seu dono. Chorei por dentro em demasiada pena, pude ver que um ser sofria mais que eu naquele momento. E quanta tristeza vai ao seu coração, quem poderá consolá-lo? Fiquei com vontade de trazê-lo para casa. Talvez ele preferisse ficar ali até esgotar a saudade.
Votei-me em sobressalto, quando deparei com o jazigo do irmão do meu bisavô que é também pai do meu tio mais querido que já sei há um ano. O Jazigo é enorme, preto de mármore, coisa fina. Além de grande é também bem alto, se destaca entre os outros em sua majestosa beleza. Com escadas laterais, vasos, um pastor enorme e de cada lado das escadas uma ovelha, tudo construído em bronze. Esse túmulo data da era de cinquenta e sete, foi quando ele faleceu. Muita gente foi ficando por ali, a família realmente é enorme.
Mas o que me assustou, embora fizesse muito tempo que não o visitava. Notei algo estranho, um vazio, esta faltando alguma coisa. Foi quando lembrei que quando era criança, subia aquelas escadas e tentava galopar nas ovelhas, era tirada dali a força e ouvindo que era um sacrilégio subir em cima dos mortos.
Suspirei, a terra não estremeceu, __onde estão as ovelhas, os vasos, o nome dele? Arrancaram e levaram tudo restando somente os parafusos.__ Que sacrilégio!!! Com certeza em coro os finados cantaram no além. Os vândalos não respeitam nada nem a memória dos mortos quanto mais a saudade dos vivos. Um roubo banal, mas se fosse para comprar leite e pão para as crianças, na verdade são crianças aprendiz desse oficio para saciar a fome de uma malvada pedra.
Sai dali, pensativa, aborrecida. Sei que isso não tem valor algum. Foi apenas vaidade de um tempo de luxo. Mas é algo que faz parte da nossa história, ninguém tem o direito de violar.
Já estava indo embora, mas antes fui visitar o túmulo do primeiro marido da minha avó materna. Quando eu era jovem, afirmei que ali seria a minha ultima morada. Sempre passava por lá, acendia uma vela e rezava uma Ave Maria.
Grande foi minha surpresa. Cadê o meu túmulo? Nossa! A coisa tá feia mesmo! No lugar havia outro corpo recentemente depositado. Realmente a coisa andou por aqui.
Passei pelo portão grande, me despedi dos mortos e fui para casa pensando em tudo isso. A quem posso reclamar?
A minha paz em vida vale mais que a paz pós vida. Porque é assim que sinto. Deixemos isso prá-la.