O filho pródigo (partida, vida e regresso)

O filho pródigo (partida, vida e regresso)

Quando saí das cercanias da minha vivenda, deixei para traz um velho alquebrado de olhos tristes, visão embaçada pelas ardentes lágrimas que teimavam em não cair, um grande número de amigos que amavam e que eu nunca percebi, e um devotado irmão que eu nunca abracei.

No dia da minha partida, segui só, cheio de sonhos, cheio de desejos, cheio de dinheiro, cheio de vida material, jovem, beleza externa, orgulho e prepotência.

Subi e desci montanhas, pernoitei em vales áridos, senti a brisa das manhãs e o vento manso das tardes. Admirei o céu estrelado e vi o luar sobre plácidos lagos. Vi o crepúsculo avermelhando o horizonte e a cada passo que eu dava, mais longe de mim ficavam os que verdadeiramente me amavam.

Encontrei pelos caminhos com caravanas de mercadores, mercenários, tuaregues, núbios, egípcios, pessoas de todas as estirpes e idiomas, cada qual ocupado em seus devaneios, cada qual em busca de seus próprios sonhos, e então, menos ainda pensei na minha antiga casa e nos afetos que lá deixei.

Viajei meses, anos talvez, por estranhas cidades. Cidades cheias de vícios, de maldades, mas eu não me importava com nada disso, minha vida agora era aventura e eu tinha dinheiro para aproveitar.

Conheci as Babilônias daqueles tempos com seus prazeres, bebidas, mulheres, orgias, fanfarrice, delírios, bebedeiras e jogos de azar.

Conheci amigos do “peito” que não me deixavam durante os dias e permaneciam comigo durantes as longas noites de festas. Estavam sempre ao meu lado e partilhavam da minha mesa, dos cálices de finos vinhos e dos perfumes nauseabundos mas viciantes das mulheres da vida.

Assim fui levando a vida em completa devassidão.

Um dia, quando acordei da minha bebedeira em completa ressaca, não vi os meus amigos de farras, e a minha bolsa que continha tanto ouro estava vazia. Gastei o patrimônio herdado de meu pai numa vida de libertinagem. Estava miseravelmente pobre. Nenhum dos meus “amáveis amigos” estava ao meu lado, agora que eu já não tinha nenhum ouro.

Meus vestidos de seda, algodão e puro linho eram os meus únicos bens. Só me restavam a roupa do corpo e algumas sandálias de fino couro.

Recorri aos mesmos bazares, cantinas, adegas e termas que freqüentava na esperança de que alguém pudesse me ajudar. Mas como eu não tinha mais posses não houve ninguém que se interessasse pelos meus problemas.

Estava faminto. Vendi minhas roupas e sandálias para poder comer míseros pães. Vagava pelas cidades sem rumo e em pouco tempo minhas vestimentas estavam em andrajos. Minha aparência era desoladora. Sujidade no corpo, barba e cabelos desgrenhados. Não era nem de longe a figura soberba e imponente de um varão pródigo que pouco tempo atrás ostentava a riqueza nas melhoras casas e palácios das urbes por onde passei.

A fome e o desprezo dos pretensos amigos fizeram-me definhar a ponto de delirar pelas vielas imundas das cidades.

Empreguei-me com apascentador de porcos numa granja nos arredores de uma cidade, e a fome era tanta que muitas vezes me servi das bolotas dos porcos. Tive saudade da casa paterna e chore amargamente. Chorei pelo desgosto e desprezo com que tratei os meus afetos. Chorei porque na minha condição subumana eu vi o sofrimento que causei aos meus. Chorei por mim mesmo porque perdulariamente eu gastei tudo que recebi como herança. Chorei pela minha alma porque já não via outra solução senão a morte que já rondava meu corpo esquelético.

Lembrei que na fazenda de meu pai os assalariados tinham melhor condição a qual eu estava vivendo.

Num momento de lucidez, lembrei-me de voltar, pedir perdão ao meu pai porque verdadeiramente eu havia pecado contra os céus e meus semelhantes. Arquitetei em voltar e pedir perdão ao meu querido pai e dizer-lhe que não era digno de seu amor e que me fizesse um seu jornaleiro. Renovei as minhas esperanças e carregado de culpa e vergonha empreendi a minha viagem de volta.

A viagem foi longa e penosa. Nutria-me de restos de alimentos, pernoitava nas lapas e covis. Caminhava sob o sol ardente,sentia o frio e o medo. Sentia-me desamparado, mas uma força interior me impelia de volta à casa paterna.

Após uma longa jornada e depois de subir num outeiro divisei a herdade de meu pai. O bulício da fazenda e a formosura da fazenda encheram-mede alegria. Finalmente poderia pedir perdão àqueles que me amavam e que eu desprezei.

Antes mesmo de chegar ao portão , meu pai correu ao meu encontro com os olhos lacrimejados, ajoelhado eu pedi perdão - Pai, pequei contra o céu e diante de ti ; já não sou digno de ser chamado teu filho.- (Evangelho de Lucas cap.15 vers. 11 a 32).

Meu pai fez uma grande festa pelo meu retorno e, embora meu irmão tivesse ficado magoado, meu pai falou que eu estava perdido e fui encontrado. Louvado Seja o Senhor Deus porque pode nos perdoar pelo nosso arrependimento. Louvado seja o Senhor que se alegra pela nossa volta ao seu lar. Louvado Seja Deus Pai, o todo poderoso pela misericórdia que tem dos filhos teus. Louvado Seja Deus pelo amor imensurável que tem por todos nós.

Guilhermino, novembro de 2011.

Techodelogte
Enviado por Techodelogte em 21/11/2011
Código do texto: T3348474
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