Conexão Haití-Brasil, e a casa da Bela Vista
“Foi horrível...”, essas foram as únicas palavras que James, haitiano de 22 anos, conseguiu dizer quando a classe lhe perguntou sobre o momento em que houve o terremoto no País onde morava.
James chegou ao Brasil há dois meses, Jovem inteligente, fala quatro idiomas, inglês e francês fluente, espanhol e português intermediário. Pouco se sabe ainda sobre o rapaz, tímido, coloca as mãos sobre o rosto, constrangido e sorrindo diz “posso não responder essa?”. Quando perguntamos o por que de vir para o Brasil, ele nos respondeu: “Para arrumar trabalho”.
Atento, ele presta muita atenção na explicação do professor Jhonatan de Novas Mídias no curso de comunicação. Um pouco confuso, por não entender algumas coisas, principalmente as gírias dos jovens daqui, ele acaba se perdendo no assunto, olha para as paredes, o teto, a estrutura antiga da casa é muito bonita, como a maioria das casas antigas da Bela Vista. Em meio a uma discussão sobre redes sociais, a sala entra em um conflito de idéias, cada um querendo expressar aquilo que pensa, eu olho para o jovem haitiano recém chegado, e ele tem um olhar assustado com a bagunça de palavras, confuso, mas contente por estar ali.
Talvez alguns momentos da nossa vida não tenham preço mesmo, é lógico que se James pudesse ter escolhido ele não iria querer que acontecesse o terremoto, e permaneceria junto de sua família, mas ele estava lá naquele momento, vivo, no meio de jovens de diferentes cores, raças, classes sociais, crenças, e aquilo para o jovem que veio do Haití sem muita coisa na bagagem, era um acesso de informação riquíssimo, então ele procurava prestar muita atenção para entender tudo.
De repente, a sala se voltou para James, e logo o rapaz foi bombardeado por diversas perguntas e curiosidades que alguns dos alunos tinham sobre o jovem naquele momento: qual era sua cidade; o que estava fazendo no Brasil se ele podia ter ido para outros lugares; se havia gostado da nossa comida; perguntaram até se o garoto já foi no Mc Donald's, que ele respondeu sinceramente e com toda humildade “O que é isso?”.
Quando se falou do terremoto, James que veio de Porto Príncepe, parte mais afetada de todo o Haití, pois foi o epicentro dos abalos, mudou seu semblante. Podíamos perceber no olhar dele que todo o filme passava pela sua cabeça novamente, as cenas de horror, gritos, pessoas soterradas, talvez ele pudesse ouvi-las, mas estavam em baixo de pedras e concreto, não se podia fazer muita coisa por elas.
“Foi horrível...”, James falou apenas essas duas palavras sobre o terremoto. Mas o corpo dele falava mais que suas palavras, e demonstrava o que ele realmente estava sentindo, o engolir seco, o dedo nos olhos para impedir uma lágrima que estava prestes a escorrer. “Foi horrível...”, apenas duas palavras, e uma pausa. Após alguns longos segundos de silêncio, que pareceram infinitos minutos, todos voltaram a fazer suas atividades, o professor começou a falar do avanço das redes sociais e o impacto que isso tinha no Mundo atual, e James ficou com o seu silêncio e os olhos admirando a linda estrutura da casa de Bela Vista.
Roger Batista. Outubro de 2011