Tarde de Verão
A tarde corre tranqüila e quente. O silêncio é perturbado, às vezes, pelo cantar de um passarinho.
É a hora em que as crianças maiores vão à escola, e as menores dormem.
Agradecendo a Deus o oportuno silêncio, escondo-me atrás dos livros para estudar.
O sol espalha o calor de Verão, a preguiça se instala comodamente no corpo das pessoas, e as moscas, cansadas de tanto calor, penetram em imaculadas residências, pondo em alvoroço exemplares donas-de-casa.
E é então que o silêncio se quebra pela algazarra de mulheres e crianças que, com panos e bombas de inseticidas, se lançam furiosamente ao combate às moscas. Todos, zangados por verem seu repouso perturbado, querem vingar-se, e para tanto armam-se de ódio e tratam de liquidar o invasor. E, não contentes em matá-lo, fazem questão de proclamar a vitória aos gritos.
Eu, sufocando num quarto fechado para livrar-me das indesejáveis moscas, tento concentrar-me num horrível ponto de Física.
Impossível.
Agora, somam-se ao calor os ruídos da luta recém-travada nas vizinhanças.
Tento resistir, esforço-me por enfiar na cabeça as fórmulas complicadas, mas é em vão. Por fim, rendo-me.
Abro a vidraça, na esperança de que um pouco de ar reanime meu espírito cansado e, ao fazê-lo, esqueço-me do inimigo. Que infelizmente nota o meu descuido e, enxotado por todos os demais, zumbindo tristemente pelos mortos, invade sem cerimônias o meu sossegado quarto.
E eu também, cedendo a instintos sanguinários, dou início à luta. Após a qual o campo de batalha fica coberto de cacos de vidro, cadáveres dos “indesejáveis” e um “pacote” que, cinco minutos antes, era uma garota que tentava estudar Física numa tarde de Verão.
(texto escrito nos idos de 1962/1963, quando ainda era estudante)