Vá se aquietar!

Vá se aquietar! Com essa frase imperativa tenho muitas vezes expressado meu carinho aos cães que crio quando chego em casa diante de sua costumeira euforia. Quem cria esses amigos sabe o quanto eles precisam demonstrar seu afeto ao seu jeito, lambendo, cheirando seus donos e balançando o rabo. Depois de satisfeitos se deitam e ficam por ali dormitando e me seguindo com o olhar sonolento, saciados.

Vá se quietar! É expressão muito usada aqui pelo Ceará, já ouvi pessoas dizendo isso para bêbados exaltados, para crianças brigando ou tagarelando, pra jovens rebeldes que teimam em desobedecer aos pais. Observem, aquietar-se é sinônimo de paz e equilíbrio, o próprio Jesus Cristo saudava seus contemporâneos com a frase: Que a paz esteja convosco!

Mas a euforia e o movimento são uma constante para quem está são e vivo. São grandes os apelos das novidades, os shoppings são convidativos, o mesmo se dá com as academias de ginástica, as baladas, os jogos, as motos os carros...as pessoas correm e a fila precisa andar, a rapidez se faz hoje com mais freqüência até nos relacionamentos a dois. Poucos são os que meditam, poucos os que se impressionam, param e refletem. A coisa anda mesmo com alta rotatividade e mais descartável do que nunca, são os “neos” em tudo, é o superficial dominando, da música à literatura, do folclore aos bons costumes. Creio que falta aumentar urgente o número de poetas, de pensadores com olhar agudo e amoroso. Desconfio que o nosso continente esteja necessitado de um severo filósofo que grite e seja ouvido pelos danados : VÃO SE AQUIETAR!

Tomara que não me tenham por ditador por estar expressando frase tão imperativa, mas como estamos vivendo a época dos neos-tudo, creio tenho pelo menos o direito de desejar paz aos atormentados pelo louco movimento do cotidiano.

Volto pra casa e quando abro o portão lá vem eles cinco: birro,bibi, bianca, black out e bili the kid, antes de minha mulher chegar à porta, meus dogs já me recebem como a um rei, com a sua pura alegria canina, e noto de cara que a euforia dos meio-atormentados que deixo no trânsito da rua, ainda não contaminou meus cachorrinhos, pois diante da carícia que faço neles e depois de ouvirem para irem se aquietar, eles me acatam. Ora! O que quero dizer com isso? Sei lá, mas é que quando a gente vai atingindo meio século de vida, já não está com o mesmo gás da juventude; enquanto alguns estão a procura de paz, outros vivem seus dias em movimento intenso, quando se é jovem entendo isso e sei que é natural na juventude e eu também já tive essa idade e esse pique. Contudo, não estou fazendo apologia para o moço se comportar como o idoso, refiro-me aos atos irrefletidos, às temeridades, aos absurdos provocados pelos vândalos e por todos que estão perdidos, sem nenhuma boa ideologia, sem qualquer tradição ou reverência ao menos pelos bons costumes, aos seus próprios corações e a si mesmos.