A banda já está tocando, vamos marchar
Determinado a escrever humor, me ocorreu a palavra Erasmo... Talvez porque Erasmo foi quem escreveu o “Elogia a Loucura”, que pretendia ser engraçado. Mas a loucura verdadeira não tem graça nenhuma. O que tem graça na loucura é o “non sense”; achamos que ela o tem e que desafia o senso comum. Mas isso é um preconceito. Os loucos não são engraçados, os loucos de verdade devem sofrer muito, muito mais do que os homens comuns e corriqueiros que só de vez em quando se descontrolam.
E olhando o que aconteceu no mundo nos últimos dias temos a impressão que a realidade é mesmo louca, tomou conta de tudo, de forma que, hoje, é inútil fazer-se um elogio à loucura, ela já faz parte do dia-a-dia.
A morte de Saddam Hussein, por exemplo, apresentou-se como ato tragicômico, onde alguém filma seus últimos momentos, mostrando o ditador outrora poderoso, ao ser questionado por um guarda que, no último momento o desafia, reassume a sua face de ditador segundos antes do alçapão abrir e lançar no ar o seu corpanzil olímpico. Ficamos imaginando as diversas figuras políticas no seu lugar, como não reagiriam? Manteriam as suas máscaras de personas trágicas das tragédias do poder, as suas carrancas de plenipotenciários?
Do outro lado do mundo, vemos a posse do presidente do Brasil, sim senhores, Lula, de novo, já sem metade da mística que hipnotizou o povo no passado, já sem a festa de quatro anos atrás, onde a esperança imperava. Agora predomina o realismo, que é quase sinônimo de decepção, seria o realismo-pragmatismo-decepção, onde se verifica que não há nenhum futuro dourado a ser atingido, nenhum mundo de paz, de progresso para todos, a julgar pelos acontecimentos cada vez mais impactantes que a nossa sociedade enfrenta.
Às velhas palavras de ordem desgastadas pelo tempo, acrescenta-se mais uma: atos violentos de bandidos são terrorismo, e os terroristas têm que ser contidos pela mão forte do estado brasileiro. Como demoramos a chegar a esse ponto, não é? Podemos agora entender o presidente Bush e sua cruzada antiterrorista, já que estamos prestes a desencadear a nossa cruzada contra o terrorismo interno do complexo bandido-milicia?
Fica, pois, muito difícil de criar um texto de humor a partir dos acontecimentos recentes. Daí o elogio da loucura salvadora. E o personagem que une as pontas soltas dessa história só poderia ser Napoleão Bonaparte, modelo de ditador e de louco, que teve profunda conseqüência na história do ocidente. As tiradas de Napoleão são pérolas de sabedoria louca. Uma delas foi dita na televisão durante a transmissão da posse de Lula. Apresentava-se a Banda Marcial dos Fuzileiros Navais, quando veio a máxima napoleônica: “bote uma banda a tocar que a multidão a segue, para a festa ou para a guerra”. Pois é, acho que a banda já está tocando.