O fazendeiro
Todo santo dia, de segunda a sexta, lá estava ele postado na esquina da Rua João Pessoa, hoje denominada Calçadão da João Pessoa. Termômetro da pequena capital do Estado de Sergipe, ali era onde se encontravam comerciantes, intelectuais, políticos, médicos, artistas, estudantes e o povo fazendo compras ou mesmo apreciando o movimento. Os estudantes universitários, politizados e ativistas faziam suas demonstrações idealistas, utópicas. Falavam de Fidel, de Che Guevara e outros. Os mais jovens, cursando o colegial, aproveitavam para sonhar também, mas sonhavam as moças com os belos líderes. Os rapazes só pensavam na beleza feminina e nas curvas daqueles jovens corpos. Eu, magrinha, aproveitava para fingir inteligência.
Acontece que mesmo sem as curvas desejadas, havia os que preferiam as magras, coisa rara naqueles dias de volumes sem pecado. Foi assim que, entre alguns estudantes que tinham esse gosto e outros que se metiam naquela rua, encontrei a exótica figura do tabareu que por mim se interessou.
Na certa que atualmente chamar alguém de tabareu pode até gerar um processo judicial. Nos anos 60 tabareu era uma palavra do cotidiano dos metidos donos da zona urbana que estranhavam as figuras da zona rural. Inclusive eu mesma estranhava.
Tabareu fazendeiro, metido em botas com esporas e, na cabeça um chapeu. Pois não é que logo ele, dono de tantos bois, gostava das magricelas? Sim, esse moço, que apesar de interiorano era muito praciante em virtude do seu alto poder de fogo econômico, começou aquilo que naquela época se chamava paquera e hoje, infelizmente, se chama assédio.
Cada dia ele dizia algo. Começou me convidando para ir a uma festa no interior. No dia seguinte disse que mandaria matar um carneiro para uma festa na qual ele desejava que eu estivesse presente, inclusive contrataria o sanfoneiro, o zabumbeiro e o triangleiro para um forró de pé de serra no qual o seu desejo era me pegar pela cintura e dançar um xote. Não aceitei e jamais o meu pai, tabareu também, e que bem entendia do riscado, me deixaria ir.
Insatisfeito e inconformado com as minhas negativas, o fazendeiro paquerador continuava e dizia que eu poderia levar todos que bem quisesse, inclusive toda a minha família. Vou matar um boi, etc, etc, etc e, antes que ele matasse a boiada, eu resolvi que mudaria o caminho de volta para casa. Foi o que fiz. Ah, mas a verdade é que não me esqueci dos olhos vivos e pidões do fazendeiro. Por onde ele andará? Se ele me aparecesse ainda, eu iria aceitar o convite, levaria toda a família e diria que agora pode mandar matar o boi.