A história 
       
das imagens trocadas

     Já disse e repito que não foi fácil trocar minha Olivetti pelo computador. Depois de um esforço danado, enfrentando instantes de saudades e hesitações, afinal, consegui. E já lá se vão uma década ou mais.
     Não sei, mas acho que em alguma crônica contei, tintim por tintim, como me despedi daquela velha e surrada máquina, companheira constante nas minhas noites de insônia e devaneios.
     Se por acaso me lembrar de coisa nova a respeito, retorno ao tema. Mesmo sabendo que posso encher o saco do caro leitor.

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     E verdade, tenho amigos que ainda se confessam fiéis às velhas máquinas de escrever, e sem nenhum pejo. Adoram-nas. 
     Me dizem que diante de um computador são assaltados por estranha amnésia. "Não sai nada", enfatizam. 
     Que fazem eles? Procuram suas Remingtons, no Site Mercado Livre vendidas como antiguidades.  "Aí - dizem - a cabeça e a memória voltam a funcionar com incontrolável vivacidade e providencial fertilidade". 

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     A condição de internauta deu-me a felicidade de viajar sem sair de casa. Um simples clique, e lá estou eu percorrendo os cinco continentes.
     Não sei se isso é uma boa. Devo me acautelar para não me converter, inapelavelmente, num turista virtual, renunciando, de vez, às grandes viagens, apesar do pavor que tenho de voar.
     Mas logo me vêm estas perguntas: por que voltar a Paris se o computador me bota dentro do Louvre ou nos cafés da Saint Germain?
     Pra que cortar mares e céus se o computador me leva de volta à Capela Sistina?
     Por que voltar a São Francisco, bela cidade da Califórnia, se a internet me traz o sensação da Golden Gate que, certa ocasião, atravessei com o coração querendo sair pela boca?

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     Ah, mas viajar é preciso.
     Pois, só indo à Piazza Navona a gente toma um bom Chiante, tendo o privilégio de ver, de pertinho, a barroca Fontana dei Quattro Fiumi, de Bernini.
     Só indo a Roma para, ainda na Navona, saborear uma pizza, admirando o Palazzo Pamphili, do século 17, construído pelo Papa Inocêncio X, sem saber que, um dia, ali se instalaria a Embaixada do Brasil na Itália.

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     Pois foi andando pelos caminhos da internet que descobri o caso das imagens trocadas, pouco conhecido, mas de significado histórico e ao mesmo tempo jocoso.
     Talvez seja um assunto que, à primeira vista, só interesse aos cearenses e aos baianos.
     Mas como quem visita esta linda Salvador, seja crente, agnóstico e ateu, sobe, invariavelmente, a colina do Senhor do Bonfim, de repente deseja saber um pouco sobre a padroeiro da Bahia, a Terra da Felicidade.
     
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     Vou contar, interesse essa história a quem quer que seja. 
     No Ceará, tem uma cidade chamada Icó. Quente, miúda, acanhada, acolhedora e repleta de muita tradição. 
     Já foi capital do Estado.
     Tem casas e sobradões azulejados, do início do século 20. Nossa Senhora da Expectação é a sua padroeira. 
     Para esta invocação ainda não encontrei uma explicação plausível. Mas, a mesma santa eu vi numa igreja de Minas Gerais quando visitei suas cidades históricas.

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     O icoense, como o baiano, tem uma particular devoção por Senhor do Bomfim. Guarda na sua igreja matriz a imagem do Crucificado, que chegou à cidade por volta de 1749, num carro de boi, presente de Portugal.
     De acordo com a lenda, a imagem do Senhor do Bomfim levada para o Icó, e que lá se encontra até hoje, devia ter vindo para Salvador; e a que está na Basílica da capital baiana devia ter ido para o Icó!

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     Nem o Google, que se julga sabedor de tudo, registrou e muito menos explicou esta esquisita troca de imagens, episódio que aqui deixo para o pessoal ligado às sacristias... Se é verdade, não sei. Mas está nos livros.
     Uma coisa. Conheço a imagem do Icó pessoalmente. E até onde me foi dado observar, diria que ela é igulazinha à imagem que, do alto da colina sagrada, abençoa os baianos. 
     Eos cearense que - como eu - escolheram Salvador, não apenas para morar, mas para viver. 
     Aqui estou há mais de cinquent´anos. É mole?
     

     


Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 15/11/2011
Reeditado em 16/11/2011
Código do texto: T3338172